Respire fundo Dante Filho (*)

Respire fundo

Não uso Facebook. Falo pouco ao telefone. Uso e-mails apenas o necessário para enviar e receber textos fortuitos. Participo de grupos de Wahatsapp com muitas restrições. Sou apenas um voyeur das redes sociais. Quando quero medir a temperatura e pressão dos comentários terceirizo as consultas. Por enquanto, tem dado certo. Até o momento não perdi nenhum amigo, não discuti com familiares e nem fui agredido por conta de posições políticas.
 
Acho que tenho sorte. Minha meta é passar por esse período nebuloso da história do Brasil mantendo a espinha ereta e o coração tranquilo. Se conseguir, vou dobrar a meta: pretendo debater o day after e falar sobre como pessoas educadas conseguiram voltar aos tempos primitivos por causa de paixões políticas momentâneas. Não sou professor de deus. Apenas guardo no peito a cautela necessária para não me perder neste turbilhão de emoções raivosas.
 
Sei que manter uma posição de magistrado nessas horas soa arrogante e impróprio. As pessoas olham pra você como se suplicasse com os olhos: qual o seu lado? Contra ou a favor? Conservador ou progressista? Impeachment ou golpe? 
 
Respiro fundo. Por hábito, leio artigos (pró e contra), recebo textos com teorias conspiratórias risíveis, ouço o bate-boca estridente entre militantes, vejo vídeos engraçadíssimos de todos os lados, recebo convocatórias para pegar em armas (metaforicamente), chegam-me mensagens de alerta sobre os perigos que nos rondam, enfim, estou em meio a uma guerra de informações e opiniões na qual sou tentado a acreditar que todos estão certos e errados ao mesmo tempo. 
 
Sinto-me aprisionado diante da bipolaridade reinante. Somos obrigados, diante das circunstâncias, a ter que escolher apenas uma cor: a vermelha ou a amarela. Não posso optar pela mistura das duas e defender o alaranjado. Sou instado a optar: pelo bem ou pelo mal. Só que, no caso, estamos num labirinto de espelhos, onde o bem pode ser o mal e o mal pode ser o bem. 
 
Momentaneamente, estamos vivendo em um sistema totalitário, onde o pensamento é vigiado e a liberdade de expressão tem que ser enquadrada num modelo de preferência política. A opinião dada é como se fosse uma marca a ferro de nossa identidade.
 
Estamos vivendo na plenitude do Estado de Exceção. Nossas ideias estão proibidas de ser moldadas pelos fatos. Uma vez feita a escolha de um dos lados, não se pode mudar. Ficamos cativos da pedra, sem ter chance de enxergar outras primaveras. 
 
Vou sobreviver a tudo isso e permanecer íntegro para contar a história lá na frente? Alguém vai descobrir de que lado estou? Haverá uma imagem, uma fala, um texto a me condenar? Sentirei o peso do dedo acusatório a me dizer que fui injusto, canalha, equivocado? Respiro fundo. Sinto que tudo isso está acabando. Ufa!
 
(*Dante Teixeira de Godoy Filho é jornalista militante em Campo Grande MS - dantefilho@terra.com.br)
 


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Postado por: Dante Filho (*), 02 Abril 2016 às 11:30 - em: Falando Nisso


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