Política não evoluiu no período pós-redemocratização Luiz Carlos Borges da Silveira (*)

Política não evoluiu no período pós-redemocratização

É profundamente lamentável e extremamente preocupante que uma simples e isenta análise chegue à conclusão de que nas últimas quatro décadas a política e os políticos brasileiros não apresentam nenhuma evolução, seguindo viés contrário a todo o processo de avanços e modernizações fantásticas nos mais importantes segmentos da vida no país e no mundo.
 
Não é nenhum exagero afirmar, diante do que se vê ao longo dos anos, que no Brasil a prática política retrocedeu, ao gosto e interesses de seus protagonistas que esquecem, ou fazem questão de não lembrar, a verdadeira essência da política como arte e ciência da boa administração pública em prol do desenvolvimento do país e bem-estar de seus cidadãos.
 
Ao período ditatorial (1964-1985) se debitavam a estagnação do pensamento político, repressão às manifestações de novas ideias, obstáculos ao surgimento e formação de novas lideranças. Então, pensava-se que ao final dessa era a política brasileira seria diferente, melhor e mais identificada com os novos tempos. Não foi o que aconteceu neste período chamado de Nova República. Aos poucos os políticos de valor foram passando, outros foram ocupando espaço no cenário e tudo voltou aos tempos da velha política.
 
Em praticamente quarenta anos de retorno da democracia plena, dois presidentes foram cassados por corrupção e outros delitos administrativos; um ex-presidente foi denunciado, investigado, processado, julgado, condenado em primeira e segunda instâncias da Justiça Federal e finalmente preso. Entre os delitos foram elencados corrupção ativa de congressistas (Mensalão) e o mais formidável esquema de corrupção (Petrolão) que quase quebrou a gigantesca estatal do petróleo.
 
Envolvendo o esquema criminoso estavam agentes do alto escalão do governo, gestores de empresas públicas, empresários da área privada além de dirigentes partidários, políticos e funcionários públicos de diversos calibres. O principal acusado, ex-presidente de dois mandatos, acabou beneficiado em incrível chicana jurídica e teve as diversas condenações anuladas. Voltou à política e está em terceiro mandato. Como efeito cascata, os demais condenados estão aos poucos voltando ao cenário por mercê da mesma graça judiciária. Não há que se questionar se houve falhas nos processos e julgamentos na primeira instância, a verdade é que os crimes ocorreram e a corrupção foi um fato – tanto que muitos condenados devolveram judicialmente parte do dinheiro desviado.
 
Outro ex-presidente, de mais recente passagem pelo Planalto, foi declarado pela Justiça Eleitoral inelegível até o ano de 2030 e ainda responde a outros processos e investigações em curso decorrentes de delitos políticos e administrativos que vão desde falsificação de atestado de vacina até subtração de bens públicos, caso das joias doadas ao país por delegações estrangeiras, e envolvimento em movimento supostamente golpista. Embora não se tenha conhecimento de corrupção, as circunstâncias indicam possibilidade de condenações pesadas.
 
Mas, o problema não é circunscrito apenas à esfera federal. As malfeitorias descem até ao mais singelo município. Segundo pesquisa da Confederação Nacional de Municípios, dos 5.563 prefeitos eleitos há quatro anos, 383 não mais estão no exercício do mandato. Destes, 210 foram cassados por variados motivos. Um portal nacional de notícias, com base em pesquisa junto ao TSE, afirmou que no Brasil a cada 8 dias um prefeito é retirado do cargo pela Justiça Eleitoral.
 
Para que não se deduza que corrupção é mal que acomete apenas políticos, o judiciário também não é imune e coleciona casos de punição a magistrados de todos os graus. Ano passado o STJ confirmou afastamento de quatro desembargadores do TRT da 1ª. Região, denunciados pelo MPF por corrupção, peculato lavagem de dinheiro e organização criminosa. Este é apenas um exemplo. O TCU e alguns TCEs também têm casos semelhantes.
 
Voltando ao tema específico da política, o que preocupa é a impressão de que no Brasil não mais existem pessoas dedicadas, honestas e com boas intenções dispostas a entrar na política.  A cada eleição há renovação, ainda que não expressiva, mas caras novas são eleitas para o Congresso, para as Assembleias estaduais e Câmaras municipais. Todavia, no comportamento dos parlamentos não se observa mudanças para melhor. Ou os bons eleitos são tão poucos que acabam sufocados enquanto vozes dissonantes, ou acabam aderindo aos esquemas viciados para mais tarde obterem vantagens. Ou, ainda pior, talvez já venham contaminados de origem.
 
O Congresso Nacional segue na perniciosa prática de criar problemas para vender soluções. O Executivo se vê compelido a negociar individualmente com parlamentares e grupos de pequena representatividade porque os partidos não são suficientemente fortes para impor a liderança nas bancadas. 
 
Preocupante é saber que o futuro do país e as esperanças da grande maioria dos brasileiros estarão sempre dependentes de políticos e governantes com esse currículo nada confiável. Até quando?
 
(*Luiz Carlos Borges da Silveira é empresário, médico e professor. Foi ministro da Saúde de novembro de 1987 a janeiro de 1989 durante o governo de José Sarney e deputado federal pelo Paraná)


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Postado por: Luiz Carlos Borges da Silveira (*), 28 Fevereiro 2024 às 11:45 - em: Falando Nisso


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