Dante Filho (*)
O suave golpe de cada dia
O Brasil sempre viveu momentos sucessivos de esquisitices políticas. Nossas rupturas – decorrentes de crises auto-impostas - atravessam o tempo mostrando que mudamos para continuar fazendo a mesma coisa. Na semana passada, mais especificamente no dia oito de abril, o poder mudou de mãos e a maioria da sociedade nem percebeu. Vivemos a era da disfunção cognitiva.
A presidente Dilma deixou discretamente o comando do País, transferindo para as mãos de seu vice, Michel Temer, a batuta da orquestração do quarteto de cordas formado por Joaquim Levy, Renan Calheiros, Eduardo Cunha e Lula. A partir de agora, quem manda pra valer, com um grau inidentificável de tom e de dissonância, é essa turma. Uma parceria que ainda vai dar o que falar, para o bem o para o mal.
O serviço só não foi completo porque na borda do palco ficou o impávido Aloizio Mercadante, Ministro da Casa Civil. Mas parece que é apenas uma questão de tempo. Lula está preparando o funcionamento da guilhotina para os próximos dias e há apostas seguras de que sua decapitação fechará uma transição suave para o governo Lulopeemedebista.
A inovação toda desse processo está no fato de que a maioria imagina que golpe de Estado seja algo necessariamente violento, em que a natureza do regime não somente se transforma radicalmente, como passa para as mãos de quem não foi legitimado pela vontade popular. Teremos que rever conceitos.
O Brasil, nesse aspecto, está fornecendo uma contribuição formidável para as ciências sociais, pois a presidente renunciou ao mandato e, ao mesmo tempo, permanece exercendo um escorreito protocolo de aparências oficiais que prova duas verdades fundamentais: a eficácia da dieta ravenna e a comprovação de que o uso de um vocabulário estranho não atrapalha a performance midiática . Afinal, o público precisa de diversão.
Fora disso, o golpe foi perpetrado sem que os eleitores, o PT e seus satélites dessem um único pio real. O movimento das ruas que se concentra em pedir “Fora Dilma” ficou com o relógio atrasado. Quem conduz a máquina do condomínio do poder é o liberalismo parlamentar e o populismo de fachada. Vai dar certo? A probabilidade de se achar que sim é a mesma de se acreditar que jumento voa.
Mesmo assim, não dá para negar um fato: houve na semana passada uma inversão do jogo. A turma que está no comando poderá dizer aos manifestantes que estão rufando os tambores nas praças: “vocês não estão entendendo nada!”.
(*Dante Teixeira de Godoy Filho é jornalista militante em Campo Grande MS - dantefilho@terra.com.br)
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Postado por: Dante Filho (*), 13 Abril 2015 às 13:30 - em: Falando Nisso