Dante Filho (*)
O som ao redor
Na semana passada recebi convite de um amigo, professor de história de uma instituição que atende jovens e adolescentes na periferia de Campo Grande, para debater as candentes questões políticas brasileiras.
Devo confessar que sou um pouco avesso a este tipo de atividade pedagógica porque ela me parece descolada dos interesses dessa meninada alegre e dançante, forjada pela escassez de recursos, de um lado, e pelo estímulo permanente ao consumismo, de outro.
Mesmo assim topei participar do “evento”, motivado por uma curiosidade, digamos, “sociológica”, porque a interlocução com pessoas que vivem experiências diferentes da sua sempre acrescenta novos ingredientes à sua capacidade de espanto.
Encontrei uma sala de aula com 75 alunos, com garotos e garotas de 15 e 19 anos (calculei), todos aparentemente desinteressados no tema proposto, mexendo nos celulares, fazendo selfies, conversando trivialidades sobre personagens das novelas da Globo, ou da dupla sertaneja do momento, enfim, coisas acerca do entretenimento da chamada onda “ostentação”.
Olhei para o meu amigo e disse sorrindo: “olha, isso não vai dar certo”. Ele achou graça, pediu silencio à classe, solicitando que todos desligassem o celular (poucos o fizeram), fazendo em seguida uma breve apresentação sobre quem eu era e que estava fazendo ali, explicando o motivo de minha presença e o assunto que iríamos debater.
De cara, percebi que não ia rolar. À simples menção da palavra “política” houve uma manifestação de escárnio geral, mas eu logo tratei de estabelecer uma aderência com o público dizendo que eu “também odiava o assunto, mas que fora escalado para discuti-lo, apesar de compreender que havia coisas mais interessantes a se fazer na vida”.
Tentei definir “política” trazendo à tona um pouco de Aristóteles, Maquiavel, estendendo o conceito de que esse era um tema que permeava a vida, forçando um pouco a barra de que a história da novela das 8 tinha elementos de política – não a partidária e a institucional, lógico – mas o subtexto que compõe as relações humanas.
O debate assim fluiu. Poucos falaram. A maioria não via a hora de tudo aquilo terminar. Outros imprecaram contra os políticos e a ladroagem nacional. O sentimento coletivo ali era de repulsa ao assunto. O propósito de professor havia fracassado, a meu ver.
No final, decidi por curiosidade (e até por brincadeira) perguntar à classe qual o nome do atual governador de Mato Grosso do Sul. A resposta veio altissonante, segura e em coro: “André Puccinelli!”.
Não é preciso dizer mais nada.
(*Dante Teixeira de Godoy Filho é jornalista militante em Campo Grande MS - dantefilho@terra.com.br)
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Postado por: Dante Filho (*), 17 Dezembro 2015 às 15:50 - em: Falando Nisso