O maior de todos os carnavais Dartagnan Messias (*)

O maior de todos os carnavais

Motivo para a festa nós temos de sobra.
 
Este será o maior — e mais repleto de significado — carnaval de todos os tempos.
 
Carnaval significa “adeus à carne” (carnis levale no latim) e a festividade foi agregada pela cultura cristã como comemoração que antecedia a quaresma. Simbolizava a despedida de uma época de fartura para o ingresso em um período de jejum e abstinência. Esta indulgência apaziguava as consciências pelos excessos de hedonismo cometidos neste período, pois nos quarenta dias seguintes as privações da carne (seja enquanto alimento, seja enquanto corpo) deveriam ser respeitadas e guardadas.
 
Com o tempo se perdeu este sentido inicial, subsistindo apenas a cultura de que neste período os excessos, as permissividades e abusos eram socialmente aceitáveis. O carnaval deixou, então, de ser uma preparação para o período de jejum e abstinência e passou a ser, meramente, uma época de tolerância e condescendência com posturas socialmente intoleráveis durante o restante do ano.  
O carnaval deste ano retorna, forçosamente, às suas origens.
 
Este ano — mesmo que sem a dignidade da abstenção espontânea — o carnaval simboliza o início de uma quaresma muito comprida e que, talvez, não será contada em dias, mas sim em anos.
 
O jejum e abstinência que se anunciam justificam o maior carnaval de todos os tempos.
 
A linha do horizonte desenha uma tempestuosa e assustadora tormenta. As privações não serão uma opção espiritual, mas uma realidade temporal e obrigatória.
 
A desconstrução social e a reengenharia ideológica da sociedade está empurrando aqueles que são incapazes de compreender a magnitude das modificações que avalizaram para a o mesmo precipício onde serão lançados os que são capazes de enxergar o que já é mais do que óbvio.
 
A corrupção e os escândalos se tornaram tão corriqueiros e cotidianos que sequer é possível centralizar a discussão e a informação em um deles. Antes de encerrar um escândalo, inicia-se outro, e outro, e outro... E, com isto, vai se banalizando o intolerável e o que era suficiente para derrubar um monarca de seu trono acaba se tornando a rotina diária e, por força do hábito, passa a ser “aceitável”.
 
A estagnação da cultura como identidade nacional e sua substituição por aforismos linguísticos preestabelecidos e empalados a golpe de martelo na consciência coletiva — porque a foice fica para a colheita dos frutos espúrios —impedem que a maior parte das pessoas seja capaz de pensar criticamente. A própria realidade é substituída por chavões ideológicos mumificados pela ignorância saudosista, reciclando slogans da década de sessenta para obscurecer a podridão com falsetes do tipo: “mídia burguesa”, “ato reacionário”, “comportamento fascista” e outras expressões absolutamente tresloucadas e extemporâneas.
 
Toda esta balela, muito bem orquestrada pelo populismo barato que é o calcanhar de Aquiles de toda a América-Latina (e nela inclui-se o País do samba), nos conduziu até este carnaval.
 
As fantasias deste ano impressionarão. Os carnavalescos estão em polvorosa com o já certo sucesso do desfile de seu bloco. Os carros alegóricos — maiores e mais tecnológicos do que nunca — ostentarão luxúria e brilho jamais vistos. Os foliões, que estão divididos neste primeiro momento, ao principiar a folia, irão se travestir de pierrôs e colombinas e, ensopados da alegria efêmera da turba, jogar-se-ão de corpo e alma neste que será o maior espetáculo da terra.
O entusiasmo e a euforia estampados no rosto de cada um dos brasileiros mostrará ao mundo — embasbacado com nossa amnésia consciente — a coragem de enfrentar as adversidades vindouras e, mesmo sem ter consciência disto, estaremos dando uma prova de otimismo ao encarar de cabeça erguida a tempestade que sequer sabíamos que estava se aproximando.
 
Depois virá a quarta-feira de cinzas e, depois dela, a quaresma e o jejum.  E daí a abstinência será longa. Por isto, aproveite o “adeus à carne” da forma mais plena que conseguir. Divirta-se. 
Sacie seus apetites.        
 
Pode ser que a quaresma demore a passar, mas, usando da mesma alegoria, sempre há a esperança da Páscoa e da ressurreição.
 
(*Dartagnan Zanella Messias é advogado militante em Campo Grande MS)
 


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Postado por: Dartagnan Messias (*), 12 Fevereiro 2015 às 18:50 - em: Falando Nisso


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