Heitor Freire (*)
O fator H
Hoje, vou escrever em primeira pessoa.
Fazendo um breve retrospecto da minha jornada, lembro-me de quando saímos de Pedro Juan Caballero, Paraguay, expatriados, com meus pais e mais cinco irmãos pequenos.
Meu pai era um comerciante bem sucedido, com um histórico de trabalho e dedicação à causa pública. E de repente, com a Revolução de 1947 no Paraguay, nos vimos expulsos do nosso país, saindo com a roupa do corpo apenas.
Chegamos em Campo Grande, e meu pai, com toda simplicidade, conseguiu um espaço no Bar Bom Jardim, foi fritar pastel, e me convocou para vender pastel pelas ruas da cidade junto com bilhetes de loteria, aos sete anos de idade. Desde então, depois de ter sido criado como um menino rico e mimado, comecei a trabalhar e não parei mais. Na realidade, não vou parar nunca.
Aos poucos, com sua grande capacidade de trabalho, meu pai foi conquistando espaços e angariando recursos. Juntamente com o dr. Wilson Barbosa Martins e outros compatriotas, ele fundou a Associação Cultural Brasil-Paraguay – embrião da hoje florescente Associação da Colônia Paraguaia –, sendo seu primeiro vice-presidente, ao lado do Dr. Wilson, que foi o primeiro presidente.
Meu pai era muito severo e profundamente disciplinador. Não admitia vacilo. Inculcou em mim e em meus irmãos o mais inabalável respeito à palavra empenhada. Insistia sempre nisso. Como exemplo marcante, eu soube, mais de 20 anos após a morte dele, por meio da professora Oliva Enciso, da doação de uma área rural que meu pai fez para a futura escola rural da Associação dos Amigos do Estudante Miguel Couto. Meu pai havia comprado uma fazenda com 1.200 hectares de área, e prometeu doar 300 hectares para a escola. Mas ao formalizar a doação, foram medir e viram que na realidade a área total da fazenda era de apenas 900 hectares. Sem que isso abalasse sua promessa, meu pai manteve sua palavra, doou exatamente como combinado, e acabou ficando com menos terras na fazenda.
Meu pai era também um idealista. Em 1952, elaborou um programa completo de reforma agrária que encaminhou para o presidente Getúlio Vargas. Minha mãe guardava o telegrama de agradecimento recebido do ministro da Casa Civil, Lourival Fontes.
Estudei o primário no Externato São José, dirigido pela severa professora Simpliciana Corrêa. Fiz a primeira série no Colégio Oswaldo Cruz. A partir daí fui para o Ginásio Barão do Rio Branco, também fundado pela professora Oliva Enciso, e passei a estudar à noite, porque precisava ajudar meu pai no Mercadinho Popular da rua 7 de Setembro, em 1952, na época em plena zona do baixo meretrício.
Assim fui crescendo e forjando meu caráter no trabalho duro e honesto. Terminado o ginásio, voltei para o Oswaldo Cruz, na Escola Técnica de Comércio Carlos de Carvalho, onde concluí o curso de técnico em contabilidade.
Fiz o serviço militar em 1959. Daí fui para o Rio de Janeiro para estudar. Mas ao passar no concurso para o Banco do Brasil, fui designado para trabalhar na agência em Ponta Porã, onde conheci o amor da minha vida, Rosaria. Casamos, constituímos família, com três filhas nascidas em Pedro Juan Caballero – porque o médico da Rosaria, dr. Diaz de Vivar, era paraguaio –, e mais tarde, em 1968, saí do Banco e nos mudamos para São Paulo, onde vivemos por dois anos.
Em 1970, voltamos para Campo Grande e aqui fincamos raízes desde então. Aqui, nasceram nossas outras quatro filhas. Naquele ano, vivemos uma tragédia familiar, com o falecimento de nossa filha Cynthia em um acidente de carro.
Em 1973, juntamente com meu então sócio, Raiman Félix, ajudamos o dr. Hélio Mandetta a fundar a Unimed. Nesse mesmo ano, abracei a profissão de corretor de imóveis.
Em 1979, concluí minha graduação em direito, na gloriosa Fucmat, embrião da UCDB.
Participei ativamente da fundação de todos os órgãos representativos da atividade imobiliária: Sindicato – do qual fui o primeiro presidente eleito e no qual permaneço como associado até hoje – Conselho Regional, Câmara de Valores Imobiliários – da qual fui o presidente instalador – e do Secovi.
Ingressei na Maçonaria, onde ascendi aos mais altos graus, e ocupei os mais representativos cargos.
Em 1992, recebi o título de cidadão campo-grandense. Em 1993, associei-me à Associação Beneficente Santa Casa de Campo Grande, onde permaneço até hoje.
Ao longo da minha trajetória fui do nadir ao zênite, e vice-versa, algumas vezes. Colecionei algumas feridas que foram cicatrizadas com o tempo.
Fiz dos ensinamentos de Jesus o meu manual de procedimentos. No santuário da minha consciência, faço o meu culto a Deus, sob a égide do Triângulo Sagrado: Princípio, Meio e Continuidade. Fé, Esperança e Amor. Pai, Filho e Espírito Santo.
Participei de muitas campanhas eleitorais, classistas ou na comunidade. Ganhei quase todas. Perdi em duas ocasiões.
Nesta última, na Santa Casa, conseguimos um feito histórico. Na instituição centenária, conseguimos eleger a primeira mulher presidente: a advogada Alir Terra Lima que, tenho plena convicção, vai fazer a diferença.
Agora, em novembro, vou receber a Ordem do Mérito do Estado de Mato Grosso do Sul, no grau de Cavaleiro.
Aprendi que o significado do meu nome é senhor da vitória. Daí o fator H.
(*Heitor Rodrigues Freire – corretor de imóveis e advogado)
Deixe seu comentário
Postado por: Heitor Freire (*), 19 Novembro 2022 às 08:00 - em: Falando Nisso