O discurso da ausência Dante Filho (*)

O discurso da ausência

A diplomação dos candidatos eleitos pelo TRE no Palácio Popular da Cultura é um evento que transcende o mero significado antropológico do rito de passagem. Apesar de cansativo e realizado em horário inadequado, o ato de entrega do diploma para deputados, senador, governador e vice etc é carregado de simbolismos porque expressa, em várias camadas psicossociais, como a sociedade politicamente esclarecida de nosso Estado passará a nutrir suas expectativas em relação a quem está chegando e saindo do poder.​
 
Isso não é trivial. Os gestos e os discursos falam por si próprios. Cada diplomado é um personagem que transita pelo palco expressando a essência de sua personalidade. O mau e o bom gosto na indumentária, a obediência ou não ao protocolo, as gafes naturais do cerimonial, a postura corporal das autoridades, tudo isso é observado como a expressão civilizatória daqueles que nos próximos anos representarão o Estado na complexidade de suas significações.
 
O ponto alto do evento são os discursos. Por regra falam os parlamentares mais votados e o governador eleito. Para estes é a oportunidade rara para falar para um público formador de opinião, que termina no boca a boca dando ampla repercussão aos ruídos que, posteriormente, se transformarão em sinais que, numa escala ideal, se transformarão no “espírito dos novos tempos”.
 
O melhor discurso da noite (na minha modesta opinião) foi o do deputado Zeca do PT (o parlamentar federal mais votado nas últimas eleições). Ele não compareceu ao evento e nem deu justificativa para esta recusa (só depois publicou um muxoxo bobo no facebook, mas isso não conta).
 
Foi o famoso “discurso da ausência”. Existem momentos em que o silencio fala mais do que milhares de palavras. Ao se negar em participar da solenidade do TRE fez do ato um momento repleto de significados. Nesse caso, Zeca mostrou que é um gênio do oportunismo político. Para quem entende a língua dos deuses deve imaginar que o ele calculou o gesto apostando que o futuro voltará a lhe sorrir novamente. Esperteza canhestra, mas esperteza.
 
Zeca mostrou que é o nosso melhor administrador de expectativas não realizadas, desde quando Pedrossian se aposentou. Seu silêncio ficou ecoando no Palácio Popular da Cultura, todo repleto de som e fúria contra “tudo isso que está aí”. Vai dar certo? Só o tempo dirá.
 
O único contraponto a esse momento foi o discurso da senadora Simone Tebet. Falando de improviso, no tom adequado, citando de cabeça trechos de poesia de Manoel de Barros, pontuando o atual momento brasileiro de crise de representação política, mostrando-se preocupada com a economia, pregando o fortalecimento da federação, ela percorreu todos os caminhos possíveis para desenhar um cenário nada róseo da realidade brasileira. Sua inteligência e fluência indicam que o eleitorado fez a coisa certa em elegê-la. Simone parece que veio para deixar marca na política regional.
 
As falas dos deputados Marquinhos Trad, Carlos Marun e do governador Reinaldo Azambuja não conseguiram ultrapassar os limites da eloqüência do “discurso da ausência” de Zeca. O deputado petista falou mais e melhor do que os três juntos. Ponto pra ele.
 
(*Dante Filho é jornalista em Campo Grande MS)
 


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Postado por: Dante Filho (*), 22 Dezembro 2014 às 14:11 - em: Falando Nisso


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