Por Dante Filho (*)
Notas do front
1-) Na manifestação do dia 15, na praça do Rádio, a turma que levantava cartazes pela intervenção militar no País era um pequeno borrão no colorido geral. Não pela quantidade de pessoas (que era ínfimo), mas pela indiferença com que eles eram tratados. Fiquei curioso e fui conversar com os defensores dessa bandeira maluca. Perguntei a eles se conclamar os militares para o jogo político não seria um despropósito. O que ouvi como resposta foi o seguinte: “Queremos os militares de volta porque o PT não deixará o poder pelo processo democrático; eles se incrustaram organicamente na máquina do Estado e estruturaram um modus operandi para comprar votos dos pobres e ignorantes usando dinheiro da corrupção; com eleição, eles não saem, só com intervenção temporária das Forças Armadas”. Esse é o argumento fechado desses caras. Tremi. Lembrei-me do filme “O ovo da serpente”, de Bergman.
2-) A massa que participou dos protestos em Campo Grande (calculei algo em torno de 40 mil pessoas) era formada pelas classes médias. Os pobres eram minoritários. A chamada esquerda democrática foi inexpressiva. Parcela significativa dos manifestantes está unida pela rejeição à política tradicional. Esse pessoal confunde conceitos. Ou seja: muitos jovens não passaram pelo aprendizado da ditadura dos anos 70 e 80. Não aceitam a representação partidária. Não percebem que sem instituições representativas não irão a lugar algum. No fundo, muitos são amadores nestes assuntos. São “adolescentes” em busca de emancipação mental para se tornarem adultos. Mas não resta dúvida que eles darão novas feições aos mecanismos de representação no futuro.
3-) A esquerda tradicional– aliada ao PT e combatente feroz da manifestação – não está conseguindo perceber que a tendência do processo – diante da degradação econômica e moral do Governo – será a de agregar de maneira crescente todos os espectros sociais difusos descontentes com o Governo. Chegará um momento em que o debate sobre questiúnculas pseudoideológicas será superado pela evidência dos fatos. Dilma e Lula vão pouco a pouco se transformando em símbolos vivos de todos os males do País. Dificilmente, conseguirão fazer reversão de imagem. Mesmo que artificialmente a economia melhore em 2018 e a grande mídia ajude.
4-) Ao contrário dos “indignados da República” não consegui ficar irritado com a vídeo-piada do Marcelo Heitor Miranda dos Santos. No primeiro momento suspirei e busquei no fundo de minha alma todos os argumentos a favor da tolerância política. A única coisa que me veio à cabeça é que o menino está perdendo tempo com a militância política. Ele tem tudo para ser um grande ator. Carro bacana, óculos escuros, cara de mau, tom de voz canalha, ironia provocativa, enfim, todos os cacoetes (sniff, sniff) dos mafiosos do cinema aqui e alhures. No papel de vilão ele seria imbatível. Imagine um filme patrocinado pela Petrobras em que ele figurasse como bandidão que atravessa a fronteira Brasil-Paraguai depois de liquidar meia dúzia de traficantes. Ah! Que tomada de cena! Que momento se poderia extrair do rapaz fazendo um monólogo de como havia sido gostoso matar a “direitinha”. O cinema brasileiro ainda não descobriu esse talento natural para mexer com nossos brios.
5-) Na vida real, Marcelo tem todo o direito de se expressar e difundir seus rancores. Defendo sua performance. Ele é a voz oficial de seu grupo. Esta é a verdade íntima do PT. O deboche que protagonizou – sob alegação de que estava fazendo uma brincadeira “irônica” – pode até ser compreendida como manifestação de insegurança pessoal para controlar o desespero que significa ver seu mundo exclusivo entrar em fase de desintegração. A militância –vocalizada pelo garoto - está vivendo, coletiva e pessoalmente, uma tremenda crise de identidade. Marcelo vive essa crise de maneira peculiar. Perdeu contato com a realidade e não imaginou as reações que desencadeariam, envolvendo inclusive as celebridades políticas da família. Noutras palavras, praticou o velho esporte de dar um tiro no próprio pé.
6-) As manifestações do dia 15 tiraram a nossa política da letargia. O PT odeia esse dinamismo de parcela expressiva da sociedade. Como já disse, a democracia é movimento; o autoritarismo deseja que o mundo fique estático. Dilma quer que o País fique parado, quieto, para que ela possa “arrumar a casa”. Não vai conseguir. Mesmo que ajoelhe, diga que errou e peça desculpas. Com as últimas pesquisas, mostrando que a crise multipolar é insolúvel, nem que ela melhore o português conseguirá conter o que vem pela frente.
(*Dante Teixeira de Godoy Filho é jornalista militante em Campo Grande MS - dantefilho@terra.com.br)
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Postado por: Por Dante Filho (*), 23 Março 2015 às 14:15 - em: Falando Nisso