Nós que aqui estamos... Maranhão Viegas (*)

Nós que aqui estamos...

 

2012 se aproxima do fim.
 
O ano em que fiz 50 foi um ano para entrar para a história. De boas conquistas. De amizade e amor. De lutas, muitas lutas. Em uma medida razoável, vivi facilidades complexas e dificuldades simples. 
 
No ano em que fiz cinquenta, me enxerguei melhor. Mais experiente, mais resistente. Enxerguei também coisas que não via antes. Minha saúde posta à prova, minha capacidade de suportar a convalescência. Sobretudo, me enxerguei mais resiliente.
 
Brinco (com seriedade) que o fato de chegar até aqui, vivo, com saúde, com a cabeça no presente e os pés no futuro, ou (dependendo do contexto) fazendo da recíproca uma verdade, me permite dizer que foi um jogo justo. Claro, com algumas derrotas, alguns empates e boas vitórias. Mas isso é do jogo.
 
No ano em que completei 50, fiz novas amizades, resgatei velhos amigos. Me distanciei de quem não me merecia. Vislumbrei novas rotas e abri novos caminhos.
 
Chego ao dezembro celebrando o fato de ter aprendido muito. Em todas as sextas que pude, por exemplo, frequentei um almoço que para mim é como se fosse uma escola. Marco Aurélio, Marco Antônio, Ronaldo, Abdon formam a mesa de professores de história e da vida. À mesa, sou um caçula aplicado ouço muito, falo o necessário e me divirto aprendendo.
 
No ano em que completei 50, tive a emoção posta à prova de uma forma dura. Perdi grandes amigos e amores. Duas dessas perdas ainda frequentam a minha mente em busca de uma improvável explicação: O Carlão Moa e a Margarida Marques.
 
A partida do Carlão me chegou como uma dura verdade no dia da mentira. Difícil de engolir. Saía de cena um companheiro de jornada da vida inteira. Desde os tempos da faculdade e, nos últimos 30 anos, parceiro de viagens e férias de família.
 
A notícia da morte da Margarida me alcançou em uma aventura amazônica. No meio da selva, senti a mais dura das solidões. A floresta como testemunha viu minha alma entristecida. Perdi um amor dos maiores que tive. Uma comadre, uma amiga, uma alma gêmea. Com ela aprendi muito sobre a dignidade do ser. E saboreei alguns dos melhores vinhos da minha vida.
 
A lista de perdas me faz ter a firme sensação de que o Século passado fechou um ciclo em 2012. Ravi Shancar, Dave Brubeck, Oscar Niemeyer, Dona Canô, Neil Armstrong, Eric Hobsbawm, Millôr Fernandes, Chico Anísio, Jon Lord, Etta James, Altamiro Carrilho, Aziz Ab´Saber, Lucio Dalla, Ernest Borgnine, Autran Dourado, Ledo Ivo, Dom Eugênio Sales, Joelmir Betting, Magro (do MPB4), Lamartine Britto, Fernando Lemos...
 
Lendo assim, concluo sem correr o risco de errar que o mundo ficou mais pobre em 2012.
 
Lembro de um documentário que assisti nos anos noventa, cujo título só se desvendava ao final – Nós que aqui estamos, por vós esperamos. Uma colagem sobre a história do Século XX e a evolução das relações humanas. Ao final, a frase título se revelava – premonitória – sobre o arco de entrada de um cemitério.
 
Enquanto lido com a sensação de perda torço para que, onde quer que todos eles que se foram estejam, que estejam bem. E que esperem um pouco mais por nós, que aqui ficamos. Nosso destino, inexorável, será cumprir essa travessia também.
 
Por enquanto a vida segue. E apesar das perdas, há motivos para buscar a alegria de estar vivo. Ontem mesmo, Mariza me escreveu falando de uma certa geração nascida sob a égide do “Cinturão de Orion”.
 
E conta de Lucas, seu sobrinho de três anos, que deve fazer parte dessa nova geração. Descreve o menino como alguém doce, inteligente, sagaz e sensível ao mesmo tempo. Capaz de comover, às vezes, pela ingenuidade; às vezes, pela rapidez de raciocínio. Lucas, diz Mariza, percebe situações de animosidade sem se assustar. E sempre as enfrenta com um convite sincero e contundente: “Vem ser feliz comigo”. Haverá alguma animosidade que resista a um convite desses?
 
Mariana Ramos, jornalista amiga, é hoje das pessoas mais felizes que conheço graças à chegada de seu filho, Bernardo. Suponho, cá comigo, que ele também deva ser parte dessa geração criada a partir do “Cinturão de Orion”. Considero que Bernardo seja quase um xará meu (minha avó, Antonieta, gostaria que eu me chamasse assim. E eu gosto de ter a sensação de carregar, por vezes, um alterego de nome Bernardo).
 
Recorro a essas duas pequenas histórias para fechar de um jeito positivo o balanço deste 2012. Sim, as perdas ainda causam dor. Mas a esperança, ingênua e persistente, aponta pra um novo ciclo. De cores vivas e, quem sabe, muito melhor do que o que se encerra agora. Quem sabe...
 
(*Inorbel Maranhão Viegas, jornalista, nasceu no Maranhã, foi radicado em Mato Grosso do Sul e hoje reside em Brasília. Como ele próprio diz, é um cidadão brasileiro)


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Postado por: Maranhão Viegas (*), 27 Dezembro 2012 às 10:09 - em: Falando Nisso


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