Dante Filho (*)
Negar, negar, negar
Esta história aconteceu em Corumbá: uma dama da sociedade local volta e meia era alertada por amigas, tias e conhecidas de que o seu marido a estava traindo. Ela dava de ombros aos alertas e dizia que tudo se tratava de fofoca, inveja, coisa de cidade provinciana. Dizia que o marido era um bom homem, correto, generoso, límpido como água de nascente. Por mais que lhe pediam para abrir os olhos, ela desconsiderava essas conversas e seguia em frente.
Até que um dia caminhando pelas ruas do centro da cidade viu à média distância uma bela mulher entrar num carro que parecia ser o de seu marido. Aproximou-se e ficou observando. Era ele mesmo aos beijos e abraços com a fulana. Para confirmar o que via foi chegando perto, mas logo eles partiram em alta velocidade para os lados do Urucum.
Ela foi pra casa, sentou-se na poltrona da sala e ficou esperando. Ele chegou mais tarde e ela foi logo dizendo: “eu vi tudo”. Ele indagou: “o que você viu?”. “Eu vi você com aquela mulher”. Ele olhou friamente para ela e disse com a calma da corrente do rio Paraguai: “não era eu”. Ela retrucou, subindo levemente o tom de voz: “era !”. “Não era!”, ele devolveu. “Meu querido, eu vi, eu vi, eu vi!!!!”.
No que ele interrompeu bruscamente e finalizou a conversa: “mulher, você acredita no que você vê ou no que eu falo?”.
Essa historieta vem a propósito do que está acontecendo no Brasil com o escândalo do Petrolão. Centenas de depoimentos, imagens, gravações estão mostrando claramente que há anos vem ocorrendo um sistemático assalto aos cofres públicos em benefício a um projeto de poder e ao enriquecimento pessoal das cúpulas partidárias e empresariais.
De acordo com depoimentos colhidos, o esquema vem sendo edificado desde 1997, no Governo FHC, mas ganhou proporções “endêmicas” nos governos Lula e Dilma. Ou seja: roubar bilhões de dólares foi “naturalizado” com um partido que prometia a redenção da pobreza e a construção de novas bases sociais no País. Tudo falácia.
Como se diz popularmente, os roubos sistemáticos na Petrobras é batom na cueca. Mas quando se questiona o presidente do PT Rui Falcão ele nega. “É golpe da mídia”, diz. Quando se interpela o tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, ele nega, e não fala com a imprensa. Lula não assume nada e mantém o mantra do “eu não sabia”. Dilma comenta o assunto como se tudo estivesse ocorrendo em outro governo. Aqui em Mato Grosso do Sul, parlamentares do PT afirmam que o “tudo está dentro da legalidade”. Todos negam tudo, e criam o mito do golpe da direita.
A história do casal de Corumbá é emblemática: “você acredita naquilo que está vendo ou no que estou falando!”. O sujeito que é fã do “Discurso do Método” de René Descartes talvez olhasse para essa questão e dissesse: “eu acredito no que estou pensando”. Mas não é preciso ir muito fundo para compreender quem está mentindo e quem fala a verdade neste drama. Muitos desesperados, para salvar os dedos, começam a entregar os anéis e, afinal, quem sabe o temor de ter que passar uma temporada na papuda não seja o grande elemento motivador dos acontecimentos recentes.
Só para consumo interno, fiz um gráfico para em entender essa intrincada história. Enumerei os envolvidos revelados pela imprensa até agora: são cerca de 300 pessoas. Logo mais entrarão uns 70 da classe política e, talvez, mais uma dezena de assessores e operadores. Ou seja: conclui que para roubar os cofres públicos em grandes proporções deve-se montar uma grande rede, com interconexões em todas as esferas de poder. Não é fácil.
Pelas contas feitas, essas 500 pessoas “administraram” um capital financeiro da ordem de US$ 100 bilhões nos últimos anos. Em valores correntes, o PIB brasileiro girou em torno de US$ 570 bilhões em 2014. É uma conta complicada de se fazer: mas o fato é que 500 cidadãos exclusivos e especiais abocanharam propinas, em vários anos, no valor de uma fatia considerável da renda nacional. Relativizando e dando descontos de praxe a turma que amealhou 10% do PIB viveria feliz para sempre não fosse ação da PF e da Justiça federal.
O Brasil tem 20 milhões de habitantes. Daí se vê que a “distribuição de renda” do PT deu-se pra valer no topo do topo da pirâmide. Para as massas, migalhas.
(*Dante Filho é jornalista é jornalista em Campo Grande - MS dantefilho@terra.com.br)
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Postado por: Dante Filho (*), 09 Fevereiro 2015 às 17:00 - em: Falando Nisso