Heitor Freire (*)
Manoel sem pé, Estado sem cultura
Em dezembro de 2017, o governador do estado, Reinaldo Azambuja, com muita pompa, acompanhado do então secretário de Cultura e demais autoridades, inaugurou a estátua do nosso poeta maior, Manoel de Barros, na celebração dos 101 anos do seu nascimento, na avenida Afonso Pena, naquilo que seria o justo reconhecimento do talento de um poeta, considerado pela crítica nacional um dos maiores do Brasil. A estátua é uma reprodução em tamanho natural, de autoria do artista plástico e cartunista da nossa terra Ique Woitschach, também conhecido nacionalmente por seus cartuns e radicado no Rio de Janeiro.
Há dois anos, a estátua de Manoel de Barros foi vandalizada, e teve um dos pés arrancados. De lá para cá, como nada foi feito e a obra não foi restaurada, ela virou um símbolo do descaso do poder público. Atualmente a estátua apresenta também danos nos óculos e no rosto.
O que não faltaram foram promessas feitas pela Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul, que sempre caem no vazio e apresentam desculpas cada vez mais esfarrapadas quando se veem cobrados pela omissão.
Aliás, descaso com a cultura tem sido uma constante por parte do governo do estado. Vejamos, por exemplo, o caso do Teatro Aracy Balabanian, que há mais de oito anos está fechado, e refém de uma inauguração que nunca acontece.
Sugiro ao governador que se informe adequadamente sobre a importância da arte na sociedade, e dê às instituições públicas que levam o nome “cultura” sua verdadeira finalidade. Muito além de shows e festivais, é preciso reconhecer a dimensão do verdadeiro sentido da cultura na construção de uma sociedade saudável. A secretaria de “Cultura” e a fundação com o mesmo nome não podem ser meros instrumentos de política partidária, sem que se vislumbrem ações que deem sentido à sua existência.
E parece que esse descaso já contaminou também a Prefeitura de Campo Grande, que recentemente “invadiu” a praça do Rádio Clube, instalando nesse local, que sempre foi um lugar de lazer da população e palco de eventos artísticos, uma unidade da Polícia Civil Metropolitana, desvirtuando seu sentido maior, usurpando seus espaços ao utilizá-lo como estacionamento dos carros da polícia.
Pelo visto, nossos deputados e vereadores não acordaram ainda para o pleno exercício de seus mandatos, pois fazem olhar de paisagem, como se a arte não fosse um dos meios mais legítimos da manifestação popular. Digo isso porque até hoje não vi nenhuma ação de parlamentares a respeito desses abusos que ocorrem em nossa capital.
Peço também aos companheiros do movimento pela defesa da sustentabilidade do complexo do Parque dos Poderes que voltem sua atenção para esses absurdos de descaso do poder público.
Levantemos nosso clamor, como disse Castro Alves, em seu célebre poema “O povo ao poder”, no qual sugere a união de todos em prol de um mundo melhor e está ligado a uma mensagem política, à união do povo contra a “exploração do homem pelo homem”.
“A praça! A praça é do povo
Como o céu é do condor
É o antro onde a liberdade
Cria águias em seu calor!
Senhor!… pois quereis a praça?”
Ante a indiferença da administração pública quanto aos verdadeiros anseios do povo, vamos solicitar que as entidades da sociedade organizada se mobilizem, porque se a comunidade não se movimentar, continuaremos – como já estamos –, órfãos de uma ação em defesa do nosso patrimônio público.
A prefeitura invade, ninguém faz nada, tudo fica por isso mesmo. O estado se omite em relação à cultura e nada sai do lugar. Precisamos acordar, e também com outras instituições promover uma mobilização geral. A praça é do povo, vamos ocupá-la e a cultura é soberana.
(*Heitor Rodrigues Freire – corretor de imóveis e advogado)
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Postado por: Heitor Freire (*), 30 Setembro 2023 às 10:00 - em: Falando Nisso