Dante Filho (*)
Lutas de abril
Categorias de pensamento e ideologia começam a ser escrutinadas à medida que o dia 12 de abril se aproxima. Quem representa o mal e quem detém o patrimônio de todas as virtudes? Essa é uma boa hora para o maniqueísmo de ocasião.
O debate sobre o melhor modelito comportamental para se vestir neste momento ferve em redes sociais, na imprensa e nas esferas acadêmicas. Com isso, velhos fantasmas estão de volta. Nas pontas desse processo a esquerda e a direita fomentam discussões típicas dos anos 70. Em vez de serem solenemente desprezadas, ocupam o centro do palco. É incrível: o tempo passa, mas o mundo muda muito pouco.
O centro político – que adensa a maioria da massa nas ruas – assiste as hostilizações vis a vis, sem compreender direito o que está em disputa, mesmo porque estão propondo algo irresistivelmente simples: “fora Dilma e o PT”.
A simplificação muitas vezes traz vantagens e problemas. Uma vantagem é que a mensagem direta exige uma tomada de posição irrecorrível não permitindo que se elaborem reflexões sobre as conseqüências posteriores caso o movimento tenha sucesso. Mas a esquerda e a direita agem como se estivessem querendo evangelizar os despolitizados, disputando palmo a palmo o sentido da verdade.
Digamos que os protestos ganhem uma dimensão fenomenal e a classe política decida empurrar Dilma e sua turma para o cadafalso. O que acontecerá no dia seguinte? Não se sabe. Poderá acontecer tudo, inclusive nada, como dizem os cínicos em situações como essa.
O grande problema dessa bandeira é exatamente essa: ela é ampla demais para que possa garantir uma solução para todos os problemas do País. Remover Dilma do poder (levando junto o PT) talvez fosse algo válido como medida pedagógica para sinalizar que a sociedade não tolera mais o discurso oficial e não aceita a “naturalização” de certas regras do jogo, principalmente quando implicam em corrupção e mentira. Mas saídas factíveis para isso que aí está levam tempo para serem elaboradas e colocadas em prática.
O vácuo de poder que se estabeleceu claramente depois de 15 março, forçando a transferência do comando do País para o Senador Renan Calheiros, o deputado Eduardo Cunha e o Ministro Joaquim Levy, vêm criando uma indefinição geral sobre o verdadeiro regime de governo atual do Brasil. Se os protestos de abril forem maiores e mais amplos essa questão ganhará contornos mais definidos.
Arrisco a dizer que o presidencialismo de coalizão será mitigado ao ponto de se criar uma coalizão parlamentar presidencial no lugar. No futuro é provável que essa esquisitice histórica mereça análises mais acuradas por parte dos estudiosos no assunto.
Neste aspecto, mesmo em meio a todas as dúvidas é certo que o chamado “projeto das esquerdas” vive uma derradeira fase de esgotamento. Mas as alternativas à direita, tipo intervenção militar, incomoda a maioria que deseja alterar o rumo das coisas dentro das regras democráticas.
De ambos os lados, percebe-se pendores autoritários tentando capturar o imaginário das massas. Entre o “exército do Stédille” e os intervencionistas das Forças Armadas há uma distância que se dilui no espaço ínfimo da estupidez. Seria melhor que eles fizessem seus próprios movimentos, separados daqueles que defendem mudanças dentro da democracia.
Enquanto a crise não encontra solução em seus pressupostos essenciais – mesmo porque a economia é fator de desgaste permanente e cria oportunidades inéditas para propostas malucas – grupos ideológicos disputam os espaços das consciências para delimitar seus campos de ação. Se passar o ajuste fiscal proposto pelo Governo, é provável que o PT definhe com uma rapidez surpreendente, sem que partidos de oposição assumam o protagonismo do processo.
Enquanto isso, o tempo corre na direção do dia 12 e as militâncias virtuais e reais confrontam-se como inimigos ferozes no front. Trata-se de uma batalha que utiliza argumentos retrógrados de divisão de classes e tendências políticas superadas, demonstrando que o País não consegue superar antigos ranços criados na estufa das desigualdades sociais.
Seja lá o que acontecer, tudo tenderá a ficar pior porque a confluência de crises simultâneas poderá parir monstrengos institucionais e estabelecer critérios de entendimento político que mantenha intocado a essência de nosso atraso: o populismo e o patrimonialismo.
(*Dante Teixeira de Godoy Filho é jornalista militante em Campo Grande MS - dantefilho@terra.com.br)
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Postado por: Dante Filho (*), 06 Abril 2015 às 17:30 - em: Falando Nisso