Hipocrisia da "Lei Seca" de muitos que prendem ou criticam Josemil Arruda (*)

Hipocrisia da "Lei Seca" de muitos que prendem ou criticam

 

Há no Brasil uma hipocrisia generalisada entre os que "santos" e "demônios" que habitam nossa sociedade. Isso se pode ver com clareza meridiana em se tratando de "corrupção", em que os mesmos que criticam aceitam receber propina ou vendem seus votos. Aliás, embora existam políticos honestos e comprometidos com o bom exercício da vida pública, grande parte dos que acusam ou se indignam com corruptos só não estão no lugar destes porque ainda não foram "pegos" em flagrante.
 
Com a "Lei Seca" não é diferente. Em que pese a real intenção do legislador infraconstitucional de preservar vidas e acabar com a impunidade em acidentes de trânsito quando envolvidos motoristas que consumiram álcool, a hipocrisia domina esse setor da vida nacional. Ao mesmo tempo que há no País uma cultura generalizada de que é errado beber e dirigir, trata-se mais de um posicionamento moral, para a maioria, do que um exercício na vida, especialmente nas "festas", "barzinhos", "shows" e nos "finais de semana familiares".
 
Também jornalistas que divulgam bombasticamente os flagrantes de bebida e volante são, muitos deles, entrados nessas festas e barzinhos, pegando em seguida seus veículos. É também a atitude dos "religiosos", que lotam igrejas, especialmente nas quartas-feiras e finais de semana, mas saem de lá cometendo todos os pecados novamente, como se pedir perdão e repetir orações ou rezas várias vezes já bastassem. Como já dizia uma antiga música: "De que adiante ir à igreja, rezar e fazer tudo errado?".
 
A ação da Polícia Rodoviária Federal no último final de semana, em Campo Grande, colocando "espião" em festa para dedurar motoristas embriagados e agentes em blitz na rodovia BR 262 está gerando muita polêmica. E deve gerar mesmo para acabar com a hipocrisia. Nas festas a maioria bebe e pega o veículo para dirigir e ir embora para casa.
 
Mesmo policiais, advogados, juízes, incumbidos de serem operadores do direito e incumbidos do processo e execução da punição dos flagrados, também são potenciais "réus". A mesma festinha que cidadãos comuns fizeram naquele final de semana também é feita por juízes, policias e advogados, também em saídas de rodovias ou outros locais, e, ao final, a maioria sai em veículos.
 
OFENSIVIDADE 
 
O que realmente importa em matéria de Direito Penal, na opinião de vários doutrinadores, inclusive Luiz Flávio Gomes, é a "ofensividade" da conduta delituosa. Para ele, crime formal não tem razão de existir, importando mesmo a materialidade estampada em dano efetivo ou real risco de lesão ao bem da vida. Nesse sentido, o ingerir de bebida alcóolica, desde que o cidadão se porte corretamente no trânsito, não colocando outras vidas em risco ou se envolvendo em acidentes, não seria crime.
 
A atual "Lei Seca", porém, não foi gestada nessa perspectiva, senão a de crime formal, bastando que o indivíduo tenho ingerido bebida alcoolica num grau mínimo para que possa ser enquadrado e até preso, caso se submeta ao bafômetro, o que faz hoje a maioria, como aconteceu também na festinha flagrada pela PRF, se recursar a passar por ele, alegando que não pode ser obrigada a fazer prova contra si mesmo. 
 
E as mudanças que estão sendo gestadas no Congresso Nacional vão no sentido de endurecer ainda mais essa perspectiva de crime formal, no sentido de que qualquer quantidade de alcoolização do motorista, mesmo que não passe por bafômetro, possa gerar prisão.
 
(*Josemil Arruda é jornalista e advogado militante em Campo Grande, editor do site MS Notícias)


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Postado por: Josemil Arruda (*), 24 Abril 2012 às 13:30 - em: Falando Nisso


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