Genoino, cidadão a toda prova Semy Ferraz (*)

Genoino, cidadão a toda prova

A mesma dignidade com que enfrentou a ditadura, chegando, inclusive, a participar de movimento de resistência armada no Araguaia no período mais sangrento da repressão política, foi constatada nas imagens em que José Genoíno se apresentou à Superintendência da Polícia Federal de São Paulo assim que foram expedidos os mandados de prisão pelo STF (Supremo Tribunal Federal) aos condenados pelo chamado Mensalão, nesta sexta-feira, dia 15 de novembro. E ele disse: “Com indignação, cumpro as decisões do STF e reitero que sou inocente, não tendo praticado nenhum crime. Fui condenado porque estava exercendo a presidência do PT. Do que me acusam, não existem provas. O empréstimo que avalizei foi registrado e quitado. Fui condenado previamente numa operação midiática inédita na história do Brasil. E me julgaram num processo marcado por injustiças e desrespeito às regras do Estado democrático de direito. Por tudo isso, considero-me preso político. Aonde for e quando for defenderei minha trajetória de luta permanente por um Brasil mais justo, democrático e soberano.”
 
Consciente de seu relevante papel desempenhado nas últimas décadas, sobretudo durante a Constituinte e nas legislaturas posteriores, dentro e fora do Parlamento brasileiro, Genoíno é cidadão a toda prova – acima de qualquer suspeita, como até seus adversários diretos reconhecem publicamente –, o que corrobora seu indignado manifesto, publicado horas antes de sua apresentação para o cumprimento da pena, como vimos no parágrafo anterior. Não tenho a pretensão de discutir a ação penal 470, que levou à condenação de dois dos maiores dirigentes históricos do PT. Sou da geração que lutou por convicção pela democracia, e defendo o Estado Democrático de Direito em quaisquer circunstâncias. Decisão judicial não se discute, cumpre-se.
 
E é como cidadão que desde a mais tenra juventude luta por uma sociedade melhor, que me permito fazer algumas ponderações sinceras e inevitáveis. Até porque a democracia é um processo histórico dinâmico, não um fóssil, inerte, estático e sedimentado: ela precisa ser aperfeiçoada, como a nossa sociedade, também. Nossa mais alta corte deu provas de independência e efetividade ao agir com desenvoltura ímpar na AP 470. Para não ficar caracterizado o temido casuísmo com os históricos dirigentes do PT – afinal, trata-se de um partido de esquerda, alvo do preconceito (quando não ódio) de classe ainda impregnado nas instituições brasileiras –, o STF (Supremo Tribunal Federal) precisa atuar com a mesma destreza, por exemplo, na ação penal 605, que tem um deputado federal de Mato Grosso do Sul, candidato derrotado a prefeito da capital, como réu. É de causar perplexidade o acinte com que ele e os demais acusados dessa ação penal agem perante a opinião pública quando inquiridos por jornalistas que tentam cobrir o caso, ocorrido um ano depois do chamado Mensalão.
 
A certeza da impunidade está evidente em seus atos: eleito deputado federal por um partido, ele migrou para o partido que governa o estado em sua frustrada tentativa de ser prefeito, retornando de novo para o partido pelo qual foi eleito, dentro da mesma legislatura, como se não devesse qualquer satisfação ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O STF precisa julgar imediatamente a AP 605 e se os acusados forem condenados, determinar a imediata prisão, assim como ocorreu com os envolvidos no Mensalão.
 
Para acreditarmos que a Justiça no Brasil está efetivamente virando a página da impunidade histórica, também o Ministério Público Federal precisa responder à representação contra o atual inquilino do Parque dos Poderes, a qual se encontra inexplicavelmente engavetada desde agosto de 2008. De lá para cá, já estamos no terceiro procurador-geral da República. Em plena vigência do Estado Democrático de Direito que nossa geração construiu ao custo de vidas humanas, é inconcebível que tudo isso não tenha passado de uma exceção, apenas para deixar tudo como sempre esteve.
 
A sociedade brasileira clama por Justiça, mas não aquela só para atender aos clamores das castas de privilegiados desde os tempos coloniais. A maturidade a que chegou a democracia instaurada no Brasil com a promulgação da Constituição de 1988 exige atitudes sinceras e coerentes. Jamais a reedição dos tribunais de inquisição, de triste memória.
 
(*Semy Alves Ferraz é engenheiro civil e atual secretário de Infraestrutura, Transporte e Habitação de Campo Grande)


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Postado por: Semy Ferraz (*), 18 Novembro 2013 às 14:34 - em: Falando Nisso


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