Existe vida lá fora Dante Filho (*)

Existe vida lá fora

O governismo é a doença infantil da política. Essa postura ideológica é maior ou menor à medida que o Estado é mais ou menos aparelhado, ou quando o clientelismo e o patrimonialismo se amalgamam no aparelho burocrático de forma determinante, estabelecendo valores hierárquicos soberanos a partir de quem indica e nomeia apadrinhados partidários. 
 
Talvez seja por essa razão que as demandas em torno de realização de concursos públicos do funcionalismo sejam constantemente apresentadas como critério para superar as dificuldades criadas pelo governismo, formando um corpo de burocratas infenso às influências deletérias dos governantes (e seu grupo) de plantão. 
 
Mas o problema é que concurso funcional por si só não resolve a questão. Na verdade, ele acaba fortalecendo o corporativismo, que faz do Estado refém de grupos sequiosos, sem finalidade específica que não seja o de ampliar benefícios e transformar a máquina pública num sistema fechado, ensimesmando funções e atividades inócuas. 
 
Muitas vezes o concurso fortalece a falsa idéia de estabilidade no emprego, criando um exército de burocratas desmotivados (os famosos cupins de hollerits), pouco criativos e com forte cultura protelatória. Se queres um monumento, olhe à sua volta.
 
Quem, na verdade, empurra e defende as políticas provisórias de Estado são funcionários comissionados, porque, para estes, o sucesso do Governo ou de seus representantes garante seus empregos e seus ganhos extras, alem de abrir espaço para influir em processos eleitorais para permanecer o mais tempo possível no poder. 
 
É desse processo que nascem e frutificam todas as contradições e deformações da administração pública. E é tam,bem daí que se nutre o fenômeno do governismo.
Sem deixar de reconhecer que há nichos de excelência profissional tanto entre concursados como comissionados, os governos não se dispõe a explicar com clareza esse dilema, mesmo porque os cargos de livre nomeação são utilizados ora como estoque fisiológica ora como forma de motivar a militância a atuar como propagandistas governamentais. 
 
Nesse ambiente difuso é muito complicado o exercício do jornalismo crítico ou mesmo da cidadania esclarecida. O governismo detesta os mecanismos de funcionamento das sociedades abertas, com seus defensores sempre relativizando as denúncias e cobranças contra os governos (e seus representantes diretos e indiretos) com teorias conspiratórias, chegando mesmo a minar o direito de liberdade de expressão com reclamos e ameaças junto ao Poder Judiciário. 
 
O governista clássico é herdeiro do período ditatorial que vivemos. Para o governista, defender gestões momentâneas (e não projetos de longo prazo) é obrigação moral, mesmo quando a lama já atingiu o nível do pescoço. Há outros tipos: o omisso, o oportunista, o serviçal, o operador, o alpinista social, o arrivista, enfim, todos eles, destroem qualquer governo pelos métodos conhecidos, mas eles sabem perfeitamente a hora exata de pular o muro quando as coisas mudam. 
 
Atribui-se ao ex-deputado Londres Machado a seguinte frase: “melhor Governo do que este só o próximo”. Eis a essência da sabedoria do governismo, com toda a clarividência de como se manter no poder, não importa quem seja o plantonista do Palácio. Londres devia ser filósofo e escrever livros.
 
O modelo estabelecido é profundamente paralisante. A ausência de massa crítica, aliada à resistência pelo exercício da transparência (e isso não é simplesmente dispor um site com informações sobre contas públicas), somando com o atual momento de crise econômica, não indica outra conclusão de que esgotamento de todo esse processo se dará de maneira traumática em pouco tempo. 
 
Os Governos (seja Federal, Estadual e municipal) vivem um momento que seria o de rever profundamente práticas e funções, mesmo correndo o risco de se tornar impopular em ano eleitoral. Mas quem terá coragem para fazer isso? Resistir e sobreviver são as palavras de ordem do momento. O Governismo está gerando em seu ventre novas formas de fascismo. 
 
Seus acólitos esquecem que existe vida lá fora. A sociedade tem um dinamismo que o setor público não acompanha. Por isso, tenta fortalecer a máquina de repressão e o controle sistemático da opinião púbica. Quem viveu, sabe que isso não dará certo. Mas o que se há de?
 
(*Dante Teixeira de Godoy Filho é jornalista militante em Campo Grande MS - dantefilho@terra.com.br)
 


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Postado por: Dante Filho (*), 05 Fevereiro 2016 às 15:15 - em: Falando Nisso


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