Educar para quê? Ângela Maria Costa (*)

Educar para quê?

"É preciso toda uma aldeia para educar uma criança" (provérbio africano).

O Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI – EDUCAÇÃO: um tesouro a descobrir, observa que, à educação cabe fornecer, de algum modo, os mapas de um mundo complexo e constantemente agitado e, ao mesmo tempo, a bússola que permita navegar através dele. Alerta que, não basta que cada um acumule, no começo da vida, uma determinada quantidade de conhecimentos, pensando que poderá se apropriar dele indefinidamente para sobreviver no futuro. 
 
Afirma que a educação permanente baseia-se em quatro pilares do conhecimento: 
1) aprender a conhecer; 
2) aprender a fazer; 
3) aprender a viver juntos; 
4) aprender a ser. 
 
Aprender a conhecer significa aprender a aprender, para se beneficiar pelas oportunidades de aprender pelo resto da vida; aprender a fazer não só para adquirir qualificação profissional, como também competência para enfrentar numerosas situações transformadoras no trabalho;  Aprender a viver juntos para desenvolver a compreensão do outro e da sua interdependência, respeito pelos valores do pluralismo e da compreensão mútua da paz;  e aprender a ser, que engloba todos os demais, para melhor desenvolver a sua personalidade e capacidade de autonomia, de discernimento. 
 
Essa educação permanente (durante a vida) não se dá somente na ESCOLA. A escola é apenas, uma das instituições sociais, seguida pela Família, a Igreja e o Estado (instituição jurídica, econômica e política) que articuladamente, estabelecem as regras e os procedimentos (modos de pensar, de agir e de sentir), como estratégia de manter a organização do grupo, isto é, formatando os indivíduos para uma determinada sociedade. Todos nós somos resultado dessa “educação compartilhada” e é por meio dela que enxergamos, analisamos, nos posicionamos e agimos no nosso cotidiano. Até há pouco tempo, sabia-se exatamente o papel de cada uma dessas instituições, que tinha como motivação natural o TRABALHO, e com isso os valores da OBEDIÊNCIA, da RESPONSABILIDADE e até da SUBSERVIÊNCIA. Hoje vivemos em um mundo conturbado e muito diferente do vivido pelas gerações passadas. Qualquer pessoa que tenha mais de quarenta anos de idade, sabe que a matemática que lhes ensinaram na escola é velha; que a gramática que aprendeu é obsoleta; que a biologia está totalmente ultrapassada e que a história é suscetível de sérias contestações. Podemos até afirmar que se ainda lembramos à maioria das coisas que nos disseram e que lemos, não passamos de uma enciclopédia ambulante de informações arcaicas. Somos da era pré-histórica, isto é, antes do Google!
 
Dessas instituições, a ESCOLA é a única instituição em nossa sociedade que é imposta a todos (ensino obrigatório) e o que acontece nela tem uma grande influência, para o bem ou para o mal. Lembrando que a educação escolar é complementar a educação familiar, família que se encontra fragilizada e a partir da segunda metade do século XX, vem passando por mudanças aceleradas em sua estrutura, organização e função. O debate recente de que o papel da ESCOLA é somente o de transmitir conhecimentos, isto é, ensinar matemática, português, história, geografia e ciências, cabendo a família a educação moral, encontra forte resistência no meio educativo. Para nós, ATRASO e DESPERDÍCIO.
 
O fato é que os problemas da sociedade não podem ser deixados à porta da escola: pobreza, fome, violência, tolerância, sexo, droga entram com os alunos nas instituições de ensino. Cabe ao professor baseada na forte relação de confiança estabelecida entre ele e o aluno esclarecer sobre os assuntos que os pais, instituições religiosas e poderes públicos falharam. Isto é inerente e a cerne do processo educativo. O seu trabalho não consiste simplesmente em transmitir informações ou conhecimentos, mas apresentá-los sob a forma de questões a resolver, situando-os num contexto e levando-os a fazer ligações no seu cotidiano. Essa relação pedagógica, estudada nos cursos de formação profissional, visa o pleno desenvolvimento do aluno e no respeito a sua autonomia. A ÉTICA que rege as demais profissões, regem também a responsabilidade ética no exercício profissional do PROFESSOR. Uma escola que pretende apenas aplicar um dos pilares do conhecimento – ENSINAR ou TREINAR, é uma escola sem função, fadada a formar seres subjugados, presos a seus preconceitos, subservientes e imprestáveis para Nós, profissionais de educação sabemos que a missão primordial da EDUCAÇÃO é de conferir a todos a liberdade de pensamento, discernimento, sentimentos e imaginação de que necessitarão para desenvolver os seus talentos e tanto quanto possível, tornarem-se donos do seu próprio destino. Somos totalmente contra a LEI DA MORDAÇA, ou como gosto de nominar, a LEI DO AVESTRUZ.  O veto do executivo a Lei da Mordaça foi um ato de coragem e de respeito a toda uma categoria profissional. 
 
Aguardamos o posicionamento do poder legislativo de nossa capital, lembrando-os que como diz Pèguy: Nós não somos homens que formamos homens para que sejam iguais a nós. Nós somos homens que formamos homens para que sejam livres de toda servidão.
 
(*Ângela Maria Costa é professora doutora da UFMS e integrante do o Movimento Por uma Cidade Democrática).
 


Deixe seu comentário


Postado por: Ângela Maria Costa (*), 28 Abril 2016 às 13:15 - em: Falando Nisso


MAIS LIDAS