Das artes liberais Heitor Freire (*)

Das artes liberais

As artes liberais são sete: lógica, gramática, retórica, aritmética, geometria, astronomia e música, e denotam os sete ramos do conhecimento. 
 
Destas, três compõem o Trivium: lógica, gramática e retórica, e são relativas à mente, ao campo da metafísica. As outras quatro compõem o Quadrivium, voltadas para a matéria, o mundo físico.
 
Examinemos, pois as artes da metafísica, aquelas do Trivium: a lógica é a arte de pensar; a gramática, a arte de inventar símbolos e combiná-los para expressar pensamentos; e a retórica, a arte de comunicar pensamentos de uma mente à outra ou de adaptar a linguagem à circunstância, conforme escreveu a Irmã Miriam Joseph (1898-1982), autora do livro Trivium. Ela explica que “estudar as artes liberais é uma atividade intransitiva; o efeito do estudo de tais artes permanece no indivíduo e aperfeiçoa as faculdades da mente e do espírito”.
 
Estou aprendendo a usar essas artes. E o aprendizado é contínuo. A esta altura da vida, eu achava (eita, verbinho terrível) que sabia pensar, falar e me comunicar. É claro, que de certa forma, tenho me virado bem. Mas ao me defrontar com o livro da Irmã Miriam Joseph, me dei conta do quanto ainda preciso aprender.
 
E também percebi o quanto nossos comunicadores, políticos, advogados, profissionais liberais, homens, mulheres e jovens teriam a aprender, caso se dedicassem ao estudo dessas artes do pensamento.
 
É muito comum ouvirmos as pessoas dizerem, ao iniciar um discurso, velhos chavões como “eu queria”, “eu gostaria”, “eu desejaria” – o que mostra claramente, a meu ver, como a imitação se propaga verbum ad verbum, sem que o orador se dê conta do quanto está imitando os outros, de forma quase automática. Basta copiar e ponto.
 
Outro vício de linguagem que tomou conta do vocabulário de forma geral é a expressão “a gente”, usada em vez de “nós”, que acabou anulando de forma categórica o pronome, levando-o para um limbo eterno, e se transformou numa epidemia verbal, praticada por todos, e consequentemente causando um empobrecimento da língua, que exige autoconsciência para ser usada de forma correta.
 
Acima de tudo, sê fiel a ti mesmo;
Disso se segue, como a noite ao dia,
Que não podes ser falso a ninguém.
(Shakespeare, Hamlet, I, 3, v. 78-80)
 
Quando nos deparamos com o significado da lógica, da gramática e da retórica, constatamos o quanto cada um de nós deve se esforçar para se comunicar de forma apropriada, manifestando a originalidade de nosso pensamento intrínseco, intransitivo. Esse procedimento concorre para o aperfeiçoamento das faculdades da mente e do espírito, como já registrou a Irmã Miriam Joseph.
 
Eu aprendi que estamos aqui para aprender. O aprendizado é infinito, pois somos seres infinitos. Esse aprendizado infinito exige, naturalmente, sinceridade acima de tudo, fidelidade a nós mesmos e obrigação permanente com a nossa própria consciência.
Voltando ao Trivium, sem exercitar a lógica (a arte de pensar), nem mesmo iniciamos a prática da arte. A gramática nos leva a buscar as palavras que expressem com exatidão o nosso pensamento, e a retórica nos faz buscar formas de expressá-las para comunicar os pensamentos de uma mente à outra.
 
Assim, senhoras e senhores, proponho que nos dediquemos ao estudo. Mãos à obra.
 
(*Heitor Rodrigues Freire – corretor de imóveis e advogado)


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Postado por: Heitor Freire (*), 19 Outubro 2024 às 09:00 - em: Falando Nisso


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