Heitor Freire (*)
Da dignidade humana
Este é um tema que está permanentemente na minha consciência. É tão marcante que já me referi a ele em diversos artigos e ao mesmo tempo é tão atual que merece um repeteco.
O comportamento do ser humano, ao longo do tempo, varia em função de muitos fatores, influências filosóficas, religiosas, políticas, econômicas, profissionais, pessoais, familiares etc.
Mas há um fator cuja dimensão transcende todos os outros, porque se alça a um patamar que o coloca acima de qualquer comparação: a dignidade humana, porque esta, quando devidamente exercida, atinge a divindade intrínseca do ser.
Quando se diz, aliás, dignidade humana, se comete uma redundância, porque a dignidade só pode ser humana. A dignidade é um atributo humano. É inerente ao ser humano. Decorre da consciência. É definida como respeito a si mesmo, amor próprio, brio, pundonor. Ou seja, todo ser humano é dotado desse preceito.
O conceito de dignidade ganhou sua formulação clássica por Immanuel Kant: "No reino dos fins, tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer equivalência, compreende uma dignidade."
Isto vem a propósito de uma cena que presenciei, na qual um dirigente de uma instituição, dirigindo-se a um subalterno, destratou-o de forma agressiva, provocando um grande constrangimento em todos que ali estavam. Apesar disso, ele continuou achando que estava certo, afinal era o chefe. Atitudes dessa natureza em nada contribuem para o aprimoramento das relações humanas. Pelo contrário.
A questão da dignidade humana é tão fundamental que consta no art. 1º da Constituição vigente:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I − a soberania;
II − a cidadania;
III − a dignidade da pessoa humana;
IV − os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”.
No direito de família, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana é o mais amplo e fundamental preceito. É um valor moral e espiritual inerente à pessoa. Assim ensina Maria Helena Diniz, titular da cadeira de Direito Civil da PUC/SP, em seu Dicionário Jurídico: “Na linguagem filosófica, (a dignidade), é o princípio moral de que o ser humano deve ser tratado como um fim e nunca como um meio”.
A propósito, voltando de novo a Kant, ele sustenta que “o Homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não simplesmente como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como as que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim”.
É relevante ressaltar que o reconhecimento da dignidade se faz inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis; é o fundamento da liberdade, da justiça, da paz e do desenvolvimento social.
Considerando a posição machista da sociedade, e na defesa da mulher, Serge Moscovici, psicólogo social, diretor do Laboratório Europeu da Psicologia Social, que ele cofundou em Paris, em 1975, assim declarou: "Os homens produzem bens, as mulheres produzem homens". Parafraseando-o, eu diria: “Os homens produzem bens, as mulheres produzem seres humanos”. E isso porque toda definição do homem como representante único do gênero humano se afigura como um preconceito machista. Desde sempre, ele é assim retratado, mas nem por isso essa definição me parece verdadeira.
A mulher, ao longo dos tempos, sempre foi colocada numa posição subalterna, que foi obrigada a aceitar passivamente. Essa posição, contrario sensu, em nada favorece ao homem; é preciso compreender e respeitar o equilíbrio entre as energias opostas, restaurando-o naturalmente. Aos poucos, ou aos muitos, a mulher vem conquistando a sua verdadeira posição de igualdade.
Se a dignidade humana é uma condição especial que reveste todo ser humano pelo simples fato de ser humano, quanto mais é condição especial tratando-se da mulher, esse ser inefável, misterioso, magnífico, enigmático. A maternidade lhe confere divindade: sem ela, não existiria a humanidade.
Concluindo, a dignidade pertence igualmente ao homem e à mulher, cujo respeito deve ser devidamente cultuado para o engrandecimento da raça humana.
(*Heitor Rodrigues Freire – corretor de imóveis e advogado)
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Postado por: Heitor Freire (*), 25 Março 2023 às 08:00 - em: Falando Nisso