Luiz Carlos Borges da Silveira (*)
Como foro privilegiado e imunidade parlamentar aumentam a impunidade no Brasil
Dois assuntos importantes vem sendo discutidos diariamente no Brasil: o foro privilegiado e a imunidade parlamentar. Mas afinal, o que eles são? Para que servem? Quem são seus beneficiários? Explico-lhes. Foro privilegiado é um direito adquirido por determinadas autoridades públicas, que de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, possam ter um julgamento especial e particular quando são alvos de processos penais. Tal privilégio é concedido a indivíduos que ocupam cargos de alta responsabilidade como: Presidente da República, Vice-Presidente, o Procurador-Geral da República, os ministros e os membros do Congresso Nacional.
Para que possamos entender melhor, usarei como exemplo a própria Operação Lava Jato. Muitos devem se perguntar porque empresários, executivos e diretores de empresas privadas, assim como da estatal envolvida no escândalo, foram investigados, denunciados e julgados tendo as penas arbitradas e daí levados à prisão, enquanto políticos, alguns com grau de participação semelhante, continuam livres e parlamentares envolvidos exercendo normalmente seus mandatos?
O foro privilegiado explica, segundo a nossa Constituição, a investigação e o julgamento das infrações penais de autoridades com foro privilegiado é de competência do Supremo Tribunal Federal (STF). O grande problema é que tal dispositivo acaba retardando a tramitação de processos e a aplicação de suas devidas penas e cumprimento das sentenças condenatórias, caso caiba. Não faz muito, tivemos exemplo disso com o chamado Mensalão que quase chegou à prescrever.
Outro dispositivo, este aplicado a parlamentares de todos os níveis, que igualmente protela ações e causa sensação de impunidade, é a chamada imunidade parlamentar. Esta, nada mais é que um conjunto de garantias dadas aos parlamentares (senadores, deputados federais e estaduais e vereadores) para que possam exercer as suas funções sem violações ou abusos, atuando com liberdade e independência no exercício de suas atividades sem o risco de serem processados judicialmente, garantias também expressas na Constituição Federal Art. 53 que diz: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. É importante notar que originariamente não existia no texto constitucional o termo “quaisquer”, introduzido pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001. Deliberadamente a interpretação da imunidade é distorcida e ampliada.
Diz-se, com certa razão, que se tornou espécie de salvo-conduto em casos de crime comum. Muitos são exemplos de candidatos que lutam de todas as formas para se eleger e assim conseguir o mandato que lhes resguarda de delitos que não são decorrentes de opiniões, palavras e votos. Outro empecilho para punição de parlamentar são as formas de imunidades, acessórios introduzidos por óbvios motivos e interesses. Entre essas formas estão: imunidades materiais, que se dividem em absolutas e relativas, e imunidades formais, relacionadas com o foro privilegiado e os processos de prisão de parlamentar.
Quando uma denúncia contra parlamentar chega ao legislativo encontra outra barreira, o pedido de licença para abrir processo. A autorização depende de decisão da Casa Legislativa que, geralmente, nega ou protela, usando para isso o “espírito de corpo”, ou corporativismo. Isso tem base no parágrafo 3º. do Art. 53 que expressa: “Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação”. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001).
Estamos progredindo, aos poucos, mas estamos. Pode até parecer utópico, mas esse é o momento de aproveitar os bons ventos de moralização e vontade de passar o país a limpo e tentar mudar. Boa parte dos males vem do foro privilegiado e da imunidade parlamentar – e isso não é cláusula pétrea. Tal mudança não é fácil, já que a decisão final cabe àqueles que desses privilégios se beneficiam, porém a vontade de mudar faz milagre, ainda que demore algum tempo.
(*Luiz Carlos Borges da Silveira é empresário, médico e professor e foi ministro da Saúde e deputado federal pelo Paraná)
Deixe seu comentário
Postado por: Luiz Carlos Borges da Silveira (*), 08 Junho 2017 às 10:00 - em: Falando Nisso