Cartórios: a segurança que você  não vê e que beneficia a todos Cláudio Marçal Freire (*)

Cartórios: a segurança que você não vê e que beneficia a todos

Após um dia cansativo de trabalho você chega em sua casa. Ao se deparar com a entrada do edifício onde mora, coloca sua digital para que a primeira porta se abra. Após transpô-la, é preciso aguardá-la se fechar para que, após se identificar ao porteiro, este abra a segunda portaria. Ao chegar em casa, precisa destrancar a fechadura superior e logo em seguida o trinco, adentrando o apartamento. Aqueles mais cuidadosos ainda desligam as câmeras de segurança que permitem que se viva o dia a dia com tranquilidade.
 
Esta rotina, em maior ou menor grau praticada por todos os brasileiros diariamente, é a que os permite viver com segurança e tranquilidade. Muito melhor seria viver diariamente sem estas preocupações. No entanto, são estas cautelas que nos dão a tranquilidade de que nossa casa não será invadida, nossos bens não serão roubados, nosso patrimônio não será dilapidado e nossa vida familiar não será desregulada.
 
O mesmo raciocínio pode ser aplicado aos serviços praticados pelos 11.946 cartórios brasileiros, presentes em todos os municípios do País, muitas vezes o único braço do Estado em cidades que não possuem agência bancária, lotéricas, posto de saúde, delegacia de polícia ou mesmo escolas públicas. Nestes locais, além de seus serviços – que são públicos, regulados por Lei, criados pelo Estado e delegados a particulares sob fiscalização do Judiciário – atuam como conselheiros jurídicos dos cidadãos.
 
Que tal seria se qualquer pessoa pudesse se casar sem a comprovação de seu estado civil? Ou se qualquer um pudesse ser protestado por birôs de crédito, sem a comprovação da dívida, de sua exigibilidade e de seu inadimplemento? Ou que alguém se passasse por você e assinasse um documento autorizando seus filhos a viajarem para o exterior na companhia de um terceiro? Ou ainda, que qualquer um registrasse como seu um imóvel, sem a devida qualificação registral?
 
Certamente, tudo seria mais inseguro. Como na segurança pública, a realização de negócios jurídicos e patrimoniais requer cuidados e certificações que impedem que direitos sejam violados e pessoas prejudicadas. O trabalho exercido diariamente pelos cartórios impede fraudes, descongestiona o Judiciário, dá segurança e facilita a vida das pessoas.
 
É por esta razão que os cartórios estão presentes em mais de 87 países do mundo, entre eles nações consideradas de excelência, como Japão, Espanha, França, Itália, Alemanha, China, entre outros. Na Espanha, os notários praticam mais de 130 atos de jurisdição voluntária, dentre eles a abertura, modificações e encerramento de empresas, evitando que pessoas sejam usadas como laranjas e a criação de empresas de fachadas.
 
Novas atribuições têm sido delegadas aos cartórios. E, a depender da vontade dos cidadãos, muitas ainda serão transferidas. Pesquisa Datafolha, realizada em 2016, identificou que os cartórios não só são as instituições públicas mais confiáveis do País, como também poderiam prestar serviços hoje oferecidos pelo Estado, como a emissão de passaportes, identidades e carteiras de trabalho, que hoje exigem deslocamentos, bem como a invariável participação de intermediários.
 
Neste sentido, a Lei Federal nº 13.484/2017, tornou os Cartórios de Registro Civil “Ofícios da Cidadania”, permitindo a realização de solicitação e entrega de documentos emitidos por órgãos públicos e privados, aproveitando a presença dos serviços cartorários em todo o País. Também regulamentada pelo Judiciário, só não está em vigor em razão de ação do Partido Republicano Brasileiro (PRB) no STF, ainda pendente de julgamento e cuja resolução os cidadãos aguardam ansiosamente.
 
Desde que foi aprovada, em 2007, a lei que autorizou que separações, divórcios, inventários e partilhas consensuais passassem a ser feitas em cartórios, mais de 2 milhões de escrituras foram realizadas, processos que desaguariam diretamente em Tribunais de Justiça de todo o País, acarretando custos que seriam suportados por todos os brasileiros. A prática destes atos significou uma economia de R$ 4 bilhões aos cofres públicos. Prazos de inventário caíram de 15 anos no Judiciário para 1 mês no cartório, enquanto um divórcio que levava seis meses agora é feito no mesmo dia em cartório.
 
Realizar a legalização de documentos para uso no exterior – procedimento conhecido como apostilamento – exigia do cidadão um périplo de três etapas por diferentes órgãos públicos, envolvendo deslocamentos, pagamento a intermediários e paciência: sua conclusão chegava a levar um ano. Agora, no cartório, é simples. O cidadão vai até a unidade mais próxima de sua residência e realiza o ato na hora.
 
Não menos temeroso é o atual lobby de empresas em torno do projeto da duplicata eletrônica, que visa permitir a entrada de entes privados nesta área, que atuarão como verdadeiras cartórios, mas sem fiscalização do Judiciário e sem as exigências cobradas dos tabelionatos: verificar, sob responsabilidade do tabelião, todos os requisitos legais dos títulos de crédito, intimação, com aviso de recebimento, do devedor, dando a oportunidade de pagar ou sustar judicialmente o protesto e, por fim, propiciar a recuperação de mais de 65% dos créditos relativos às Duplicatas, com o pagamento dentro do prazo legal de três dias úteis.
 
É por este motivo que cada vez mais se busca a desjudicialização de atos, transferindo aos cartórios serviços antes praticados diretamente pelo Poder Público, mas sem tirar-lhes o caráter público, visando facilitar a vida do cidadão e tornar o acesso à prática dos serviços mais simples e menos onerosa, mantendo a segurança jurídica que permite uma convivência pacífica e harmoniosa na sociedade.
 
(*Cláudio Marçal Freire é presidente da Associação dos Notários e Registradores do Brasil - Anoreg BR)


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Postado por: Cláudio Marçal Freire (*), 31 Julho 2018 às 14:30 - em: Falando Nisso


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