Carlinhos, o primeiro sul-mato-grossense Wagner Cordeiro Chagas (*)

Carlinhos, o primeiro sul-mato-grossense

No dia 12 de outubro de 1977, o jornal campo-grandense Correio do Estado, o segundo mais antigo de Mato Grosso do Sul, trouxe em sua capa as comemorações pela tão sonhada (não se sabe se o sonho era de todos) divisão do estado de Mato Grosso e a criação de Mato Grosso do Sul. Uma imagem do presidente Ernesto Geisel no ato de assinatura da divisão, em Brasília, e da chamada “passeata monstro”, em Campo Grande, preenchem a primeira página daquele diário. Juntamente com essas imagens se encontra a foto de uma enfermeira com o primeiro bebê nascido naquele dia na maternidade de Campo Grande, o primeiro sul-mato-grossense. Seu nome era Carlos Gonçalves Pinto, o Carlinhos.
 
Segundo a matéria, Carlinhos nasceu às 13 horas e 15 minutos do dia 11 de outubro, minutos antes de sua mãe ter enfrentado um intenso trânsito pelas ruas da cidade devido às comemorações pela criação de Mato Grosso do Sul. Sua chegada ao novo estado se deu por parto normal feito pelo médico Carlos Henrique, com auxílio das enfermeiras Nair e Alzira. O menino pesava mais de 3 quilos. Sua mãe Iva Ferreira, era dona de casa, e o pai Carlos Pinto, pedreiro da construtora Construmat. O casal era humilde e vivia na luta diária pela sobrevivência.
 
Carlinhos nasceu num estado em que a população tinha grandes expectativas quanto a seu futuro, já que a propaganda do governo militar ao criá-lo era de que Mato Grosso do Sul seria um estado modelo para o Brasil. Por aqui tudo seria novo, exemplar, principalmente a política. No entanto, não foi o que se viu nos 2 primeiros anos de instalação do estado. Entre 1979 e 1980 uma crise política ocasionada pelas disputas pelo cargo de governador levou MS a ter 4 governadores: Harry Amorim Costa (ARENA), Londres Machado (ARENA), Marcelo Miranda Soares (ARENA/PDS) e Pedro Pedrossian (PDS).
 
Os pais de Carlinhos devem ter participado da importante eleição de 1982 que escolheu Wilson Barbosa Martins (PMDB) como o primeiro governador eleito pelo voto popular. Possivelmente devem ter ouvido falar nas tragédias naturais, causadas pelo homem, em rios como o Taquari, e sobre a caçada ilegal e covarde aos jacarés para a retirada de seu couro. Certamente assistiram nos telejornais locais as notícias sobre o assassinato do líder Guarani-Ñandeva Marçal de Souza, no dia 25 de novembro de 1983, no município de Antônio João, figura símbolo da luta pela terra indígena, que ficou conhecido internacionalmente.
 
Se Carlinhos estudou numa escola estadual ele experimentou as diversas greves dos professores, quando a FEPROSUL/FETEMS precisou colocar o magistério nas ruas para que os governantes das décadas de 1980 e 1990 cumprissem a lei e pagassem os salários atrasados ou concedessem o reajuste exigido pela categoria.
 
Mas, nem só de notícias e momentos desagradáveis viveu Mato Grosso do Sul nesse período. Apesar de muitas dificuldades, o estado viu surgir obras importantes, de todos os governantes (uns com grandes volumes, outros com menos), que contribuíram significativamente para o desenvolvimento do estado, como construção de rodovias, pontes, hospitais, creches, escolas. Programas sociais foram criados em algumas gestões (Panelão, Vale Cidadania, Segurança Alimentar, Cursinho Popular Pré-Vestibular, Vale Renda, Vale Universidade) e contribuíram significativamente para melhorar a vida de muitos cidadãos.
 
E hoje, por onde andará o primeiro sul-mato-grossense? Será que ainda reside neste estado e na bela Cidade Morena? Comungará Carlinhos das esperanças de muitos de nós sul-mato-grossenses por dias melhores para este lugar, com melhor distribuição de renda, com a questão dos conflitos entre indígenas e produtores rurais resolvida? De um estado que respeite a diversidade de seu povo? Que ofereça uma educação pública para suas crianças, jovens e adultos, com maior qualidade? Enfim, serão as expectativas de Carlinhos e de todos nós aquelas dos primeiros meses da criação de Mato Grosso do Sul?
 
(*Wagner Cordeiro Chagas é mestre em História pela UFGD e professor em Fátima do Sul - MS e-mail wc-chagas@hotmail.com)


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Postado por: Wagner Cordeiro Chagas (*), 05 Outubro 2015 às 13:20 - em: Falando Nisso


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