Semy Ferraz (*)
Bem-vindo, Snowden!
Edward Snowden – o americano que teve a coragem de contar para o mundo o Big Brother em que se transformou a globalização, onde ninguém está livre de ganhar um grampo impunemente – revelou na Rússia que gostaria de pedir asilo político ao Brasil. Já imaginaram a atração turística (e jornalística) que a presença dessa nova celebridade poderia dar ao país?
Snowden encontra-se provisoriamente numa área de trânsito de um aeroporto internacional da Rússia desde que vazou para a imprensa a violação de privacidade pessoal e de soberania nacional praticada pela NSA (Agência Nacional de Segurança) contra cidadãos e governos por meio da internet. Ele hoje recebe tratamento de “inimigo número um” pelo governo estadunidense, o mesmo que o dispensado a temidos terroristas que ameaçam o Tio Sam.
Mas, ao contrário do que a mídia ocidental infere, Snowden prestou com sua denúncia um relevante serviço para a democracia e a soberania das nações. Até porque crime na legislação dos Estados Unidos também o é na maioria dos países sob o império da lei e do Estado de Direito. Imaginem se a moda pega, e adversários ou concorrentes comerciais, sob o argumento de se sentirem ameaçados pelo outro, lançam mão dessas “inovações”.
Os mais velhos irão se recordar que no início da década de 1970, auge da Guerra Fria e início da humilhante derrota dos Estados Unidos no Vietnã, o presidente Nixon preferiu renunciar a ter que sofrer um impeachment por ter usado grampo para espionar a campanha do democrata Mac Govern, o adversário que ameaçava sua reeleição. Denunciado o esquema de espionagem eleitoral por jornalistas do Washington Post, em pleno segundo mandato presidencial, a sociedade estadunidense foi às ruas em defesa do símbolo maior da democracia americana: a liberdade acima de tudo.
No entanto, depois da queda das Torres Gêmeas de Nova Iorque, os americanos viram cair por terra valores maiores, como liberdade de pensamento e de ação, em troca de uma sensação de segurança cada vez mais cara. Em nome da luta contra o terrorismo (invisível, porque ele não tem governo instituído, não tem nacionalidade e abala a intimidade das pessoas), os “arapongas” e assemelhados incubados nos órgãos de segurança da até há pouco maior democracia do ocidente passaram a ter carta branca para bisbilhotar o dia a dia de cidadãos, empresas, tidos, organizações e governos Curiosa situação em que os Estados Unidos se meteram, pois de emblemática terra da liberdade e da democracia, hoje precisam se justificar para o mundo pelas traquinagens de espiões bizarros que, em nome de um patriotismo cada vez mais ufanista, parecido ao do Reich ou do Duce, ou talvez aos nada saudosos tempos do “Brasil: ame-o ou deixe-o”. Temos, aliás, muita experiência acumulada desse tempo. E sabemos que nada paga a perda de nossa liberdade, privacidade ou soberania.
Por tudo isso e como reconhecimento do nobre gesto desse americano corajoso, por que não darmos as boas-vindas a Snowden? Figuras comprovadamente criminosas já tiveram acolhida no País, como um dos assaltantes do trem pagador inglês, Ronald Biggs; o torturador nazista Joseph Mengele, e o ditador paraguaio Alfredo Stroessner. A bem da verdade, a simples presença dele viria a inibir os que se sentem acima da lei e vivem tentando cometer esse tipo de crime em território brasileiro.
Portanto, bem-vindo, Snowden!
(*Semy Ferraz é engenheiro civil e secretário de Infraestrutura, Transporte e Habitação de Campo Grande)
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Postado por: Semy Ferraz (*), 15 Julho 2013 às 11:14 - em: Falando Nisso