Advocacia ou Indústria Leonardo Avelino Duarte (*)

Advocacia ou Indústria

Já viram alguma grande banca de advocacia por dentro? Vale a pena. É um mosaico de caras e mesas, ladeado pela batidas incessantes de ansiosos dedos nos teclados. O ir e vir apressado de gente engravatada ou de terno ajuda a compor o quadro, não muito diferente, creio, daquele de uma redação de jornal.
 
Ninguém para. Não há uma pausa, horário do lanche ou do tereré, tempo para navegar na internet, nada. É uma batalha contra o tempo. Ou o advogado vence o prazo, ou os prazos o vencem. Quando o advogado sai, é porque está em audiência, mas isto não é mais tão comum. A moda agora é contratar gente só para fazer audiências, o dia inteiro.
 
Há pouco tempo, inclusive, para pensar. Pouca gente cria teses ou se socorre dos livros de doutrina para lançar mão de um argumento diferente. A receita comum, para vencer o prazo, é reaplicar a fórmula conhecida, do copia e cola, mudando apenas o nome das partes e sua qualificação.
 
Há escritórios em Mato Grosso do Sul com cinquenta, cem, cento e cinquenta pessoas, entre advogados e estagiários. Poucos são sócios. Os salários iniciais são baixos, tanto para redigir peças (cuidar dos prazos, como dizem), como para serviço externo. Há casos em que não se respeita a tabela de honorários da OAB. Soube de gente que aceitou participar de audiência por vinte reais.
 
A advocacia de massa, tão comum hoje, é como o mundo moderno. Nivelado, impessoal, apressado. Não faltam clientes: bancos, indústrias, prestadoras de serviços públicos e grandes empresas, quase todas reservam um percentual de seu orçamento para o “jurídico”, aí incluído os gastos que devem ter com advogados, condenações e acordos judiciais. Por vezes, pouco importa se ganharam ou perderam a causa, o que querem mesmo é não extrapolar o orçamento com gastos judiciais, economizando o quanto puderem.
 
A antiga advocacia liberal, aquela em que o advogado aconselhava o seu cliente, tinha a liberdade de aceitar ou não a causa, e elaborava suas peças artesanalmente, com muito estudo, está em extinção? Não. Mas é obra para cada vez menos advogados.
 
Essa proletarização da profissão tem várias causas, bastando destacar duas: o grande aumento do número de faculdades de direito, que, mesmo como o exame de ordem, despejam mais profissionais no mercado do que o necessário - gente que muitas vezes é obrigada a aceitar qualquer tipo de trabalho para poder começar a carreira - e um sistema processual confuso, que perpetua conflitos e ainda está se adaptando para a o fenômeno das causas repetitivas.
 
Mas fica o alerta para nós advogados. É cada vez mais tênue a diferença entre um escritório de advocacia e uma indústria jurídica.
 
(*Leonardo Avelino Duarte é advogado, conselheiro federal da OAB e ex-presidente da OAB-MS)


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Postado por: Leonardo Avelino Duarte (*), 06 Novembro 2013 às 11:43 - em: Falando Nisso


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