A proteção contratual do consumidor Marcelo Salomão (*)

A proteção contratual do consumidor

Na relação de consumo observa-se evidente desigualdade entre as partes: de um lado está o consumidor, reconhecido expressamente pelo Código de Defesa do Consumidor – CDC como vulnerável, justamente por ser a parte mais fraca na relação, quer tecnicamente ou economicamente e, de outro, o fornecedor, detentor nato de todo conhecimento acerca do produto ou serviço que coloca no mercado de consumo, de todas as suas características e singularidades e que concentra, geralmente, a maior força econômica.  
 
Visando atender as necessidades do consumidor e, de certa forma, equilibrar essa relação que já nasce em desigualdade, o CDC cita, em seu artigo 4º, princípios norteadores da política nacional de defesa do consumidor, dentre eles os mais importantes são os da boa – fé, da transparência e da vulnerabilidade.   
 
Neste aspecto, os conteúdos das cláusulas contratuais constantes em um contrato referente a relação de consumo devem observar referidos princípios, sob pena de serem consideradas cláusulas abusivas. 
 
Assim, a cláusula abusiva pode ser assim interpretada sempre que for notadamente desfavorável à parte mais fraca da relação de consumo: o consumidor. É aquela cuja redação quebra o equilíbrio entre consumidor e fornecedor que o CDC, por meio dos princípios citados, tenta reestabelecer. 
 
A proteção contratual do consumidor é seu direito básico, enumerado no artigo 6º, inciso IV do CDC.  Por sua vez, o artigo 51 do CDC enumera 17 cláusulas relativas ao fornecimento de produtos e serviços, entre outras, que são nulas de pleno direito por serem cláusulas abusivas.  
 
As cláusulas abusivas geralmente são mais observadas em contrato de adesão, contudo, não se restringem a este tipo de contrato. Sua identificação cabe em qualquer contrato, escrito ou verbal, que tenha uma relação de consumo disposta em seus termos e que se verifique o desequilíbrio contratual favorecendo o fornecedor em detrimento do consumidor. 
 
Entretanto, cumpre ressaltar que o rol da referida norma não possui caráter taxativo, mas sim exemplificativo. Desta forma, outras cláusulas, além das enumeradas nos incisos do artigo 51 do CDC, podem ser consideradas abusivas, dependendo de entendimento jurisprudencial. 
 
Cita-se as cláusulas abusivas, elencadas, exemplificativamente, no artigo 51 do CDC: as que impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos; que subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos no CDC; que transfiram responsabilidades a terceiros; que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade ou, ainda, que estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor. 
 
Além das cláusulas abusivas elencadas acima, a norma enumera, ainda: as que determinem a utilização compulsória de arbitragem; que  imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; que deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor; que permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; que autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor; que obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor; que autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração; que infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais; que estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor e que possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias. 
 
Por fim, a Lei n. 14.181/2021, que alterou o CDC, incluiu duas cláusulas no rol exemplificativo de cláusulas abusivas do artigo 51 do CDC; as que condicionem ou limitem de qualquer forma o acesso aos órgãos do Poder Judiciário e as que estabeleçam prazos de carência em caso de impontualidade das prestações mensais ou impeçam o restabelecimento integral dos direitos do consumidor e de seus meios de pagamento a partir da purgação da mora ou do acordo com os credores. 
 
(*Marcelo Monteiro Salomão é advogado, mestre em Direito Civil e atual superintendente do Procon-MS)


Deixe seu comentário


Postado por: Marcelo Salomão (*), 26 Janeiro 2022 às 12:15 - em: Falando Nisso


MAIS LIDAS