A propósito do famigerado 12º Big Brother Brasil Maria Ângela Coelho Mirault (*)

A propósito do famigerado 12º Big Brother Brasil

 

Nem o Bial nem a emissora que oferece o espetáculo dantesco à família brasileira, na hora do jantar, pode ser a única responsabilizada pela bizarrice do programa de maior audiência da televisão brasileira. Seu aval vem da audiência que o povo lhe confere.  Essa é uma matemática simples.
 
Expressar, difundir e intercambiar ideias sempre foram necessidades intrínsecas à sociedade. A liberdade de expressão é um direito preceituado pela Declaração Universal do Direito do Homem (1948). Nossa Constituição (1988) lavra ser “livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença”.  Sob esses dois princípios atribuem-se à mídia em geral – e, em particular, à imprensa - o papel e o dever socioeducativo de intermediar o fluxo das mensagens informacionais para que, livremente, possa o homem formar o seu juízo de valor, diante dos fatos.
 
A imprensa - palavra cujo significado vem de "prensa móvel" - surgiu há muitos milênios como um artefato para suprir a necessidade humana de informação. O estabelecimento de uma função social à imprensa deu-se a partir de três grandes movimentos revolucionários e paradigmáticos: na Alemanha, por volta de 1495, com Gutemberg, subsidiando a Reforma Luterana e popularização da Bíblia; no século XVIII, durante a Revolução Industrial; e, de fato, sob um alvará libertário, por ocasião da Revolução Francesa (1879), com a emersão de uma imprensa revolucionária e opinativa junto à burguesia, naquele momento. 
 
O século passado viu surgir uma nova e potente diversificação dos canais informacionais trazidos pelo rádio e pela televisão. Em atendimento a um nascente mercado consumidor, a propaganda e o marketing passaram a influir, ideológica e economicamente, nos aparatos midiáticos, inaugurando uma cultura (e um consumo) de massa, na qual consumo e consumidor tornaram-se alvos de suas mensagens. 
 
O advento das mais recentes tecnologias da informação assinalou nova revolução, ao oferecer - por intermédio das mídias digitais e todo seu aparato inovador e renovador - ao, antes, receptor passivo, novas perspectivas de compartilhamento e gestão da informação. Atualmente, vivemos uma revolução mais radical, irreversível e paradigmática, trazida pela potencialidade quase infinita do uso da internet. 
 
Ora, em vistas desse breve relato, por que, simplesmente, imputar a esses aparatos midiáticos (seus produtores e produções) a responsabilidade pela (má, ou baixa) qualidade da informação (?) veiculada? As mídias expõem, em mensagens absurdamente caricaturadas, os valores aceitos, comungados, preconizados e institucionalizados - no âmbito das normas, procedimentos, práticas e costumes - de determinada época por uma determinada sociedade.
 
É fato que a mídia em geral - utilizando-se das prerrogativas universais e constitucionais de liberdade de expressão, deixa lacunas (morais) no cumprimento do seu papel socioeducativo. Porém, a mídia não cria, não inventa, não abduz seu consumidor. Ela, simplesmente, traduz, reflete, ecoa desejos e práticas, antes, adotadas e circulantes no espaço da cultura de um povo. O alto índice de audiência do programa televisivo Big-Brother-Brasil, e toda sua repercussão é exemplo disso. A fala do jornalista Pedro Bial, veiculada pela revista Veja (18/01/12) sublinha isso. Afirmou, ele: “... tive de me despir da condição de jornalista e ser um Zé Mané junto com os outros”. De fato, uma mídia, realmente, livre e consciente do seu papel social auxiliaria muito à aniquilação dos “zé-manés” a que se refere. Uma imprensa responsável por sua função social poderia, sim, ajudar a promover a revolução que muitos de nós almejamos; a revolução da consciência crítica, do juízo de valor, do discernimento e do critério sobre o que deve, ou não, vigorar como princípio ético e estético. 
 
Não havendo essa reflexão, somos todos “zé-mané”, refletidos nessa estética de horrores, que nos retrata de forma tão vil, tal como (ainda) somos. Contudo, é preciso que reconheçamos: os estupros (?!), orgias, futilidades, aberrações e bizarrices ofertados noite após noite pelo famigerado Big Brother Brasil têm a nossa assinatura, a nossa cara, o nosso gosto e, principalmente, conta com o aval da nossa audiência e da nossa consciência. Mudemos, pois, para que o reflexo da nossa imagem se transfigure, pois,  por enquanto, somos todos muito feios, muito pouco éticos, quase nada estéticos.  
 
(*Maria Ângela Coelho Mirault, residente em Campo Grande-MS, é doutora e mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP mariaangela.mirault@gmail.com)


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Postado por: Maria Ângela Coelho Mirault (*), 19 Janeiro 2012 às 13:42 - em: Falando Nisso


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