Heitor Freire (*)
106 anos
Com pompa e circunstância, no dia 17 de agosto foi festivamente comemorada a data em que, há 106 anos, alguns cidadãos se reuniram para dar início à arrecadação de fundos para a criação da futura Santa Casa de Campo Grande.
A nossa Santa Casa atinge hoje a maioridade administrativa e funcional sob a presidência da dra. Alir Terra Lima, cuja dedicação e competência estão presentes desde o primeiro dia de sua gestão. A energia que emana hoje em nosso hospital é de uma vibração muito elevada, de puro amor à Santa Casa, criando um ambiente de alegria e satisfação no trabalho.
A comemoração nos transporta para o dia 17 de agosto de 1917, quando alguns cidadãos. imbuídos do mais puro espírito de fraternidade e com alto senso de solidariedade, se reuniram para dar início às ações da campanha de arrecadação de recursos, com a participação entusiasta da população que, naquela época, somava 5 mil habitantes na área urbana e mais 3 mil na área suburbana e rural, totalizando 8 mil habitantes.
A arrecadação alcançou a elevada soma de 28$500.000 (vinte oito mil e quinhentos contos de réis), com a contribuição de 183 cidadãos, correspondente a 3,66% da população. Para se ter uma ideia do que representa esse número, seria como se hoje mais de 30 mil habitantes participassem de um projeto dessa envergadura.
Assim, no dia 03 de junho de 1919, foi fundada a Sociedade Beneficente de Campo Grande, elegendo como seu primeiro presidente Euzébio Teixeira.
Com esse valor em caixa, no dia 20 de janeiro de 1920, por 10$000.000 (dez mil contos de réis), foi lavrada a escritura de compra do terreno com 60 mil metros quadrados que constituiu o primeiro patrimônio imobiliário da Santa Casa, adquirido sob a presidência de Bernardo Franco Baís.
Com o restante, começaram as obras dos primeiros pavilhões que seriam inaugurados em 1928, durante a presidência de Eduardo Santos Pereira, dando início ao atendimento médico-hospitalar à população da cidade.
A Santa Casa sempre contou com a participação efetiva de cidadãos conscientes, dedicados e com o firme propósito de administrar uma instituição que, desde sempre, vem prestando serviços da mais alta relevância, fazendo-o de forma voluntária. Até hoje, nenhum administrador ou membro das diretorias e conselhos teve qualquer remuneração financeira.
Esse foi um tempo glorioso. Mas nem sempre foi assim. A incompreensão e a indiferença do poder público têm sido uma constante. Nesses 106 anos de história, tivemos um período negro, de profunda desilusão com a administração municipal e estadual, quando em 2005 sofremos uma intervenção, na verdade uma invasão ilegal e injusta, fruto da ambição de um gestor que quis se transmutar em dono da Santa Casa, apoderando-se ilegalmente do CNPJ da nossa instituição, fazendo empréstimos e gerando dívidas que ficaram como rescaldo desse período em que fomos expulsos da nossa casa.
Essas dívidas imensas depois foram negociadas com um pseudo pagamento por parte do poder público municipal e estadual, quando por força de uma sentença judicial retomamos a administração do hospital. Pseudo, porque na realidade, a Santa Casa teve que seguir pagando essa negociação sob a forma de prestação de serviços.
Também por iniciativa do mesmo gestor, o hoje senador Nelsinho Trad, foi invadido o Colégio Oswaldo Cruz, impedindo que a administração da nossa associação finalizasse um convênio com o Senac para utilização plena daquele colégio.
A restituição do nosso patrimônio não teria fim, não fosse uma longa e penosa caminhada, de mais de 8 anos, por todas as esferas dos tribunais superiores, sustentada pela banca de advogados, liderada pelo dr. Carmelino Rezende.
No que concerne ao Oswaldo Cruz, diga-se de passagem, uma generosa doação do dr. Luiz Alexandre de Oliveira para a Santa Casa, o Colégio, mesmo depois de cessada a intervenção, só voltou às mãos da Santa Casa por meio da ação de despejo, que foi decretado, via do qual pudemos recuperar nossa propriedade, como, ainda, para receber uma indenização pelo mau uso do prédio no valor de R$ 5.779.078,54 (cinco milhões, setecentos setenta e nove mil, setenta e oito reais e cinquenta e quatro centavos), devolvido em escombros, demonstrando assim a ilicitude da indevida apropriação.
Essa indenização foi paga pelo erário público, pela prefeitura, ou seja, com dinheiro do contribuinte, quando, na realidade, deveria ser custeada por quem lhe causou prejuízo, como determina a Constituição Federal, em seu artigo 37§ 6º.
Nas futuras comemorações de aniversário de fundação da Santa Casa vamos sempre ressaltar que, dos 106 anos, tivemos um período no exílio, onde os associados sequer podiam adentrar nas instalações do Hospital, vivemos um período negro de intervenção ilegal e injusta; portanto, comemoraremos 98 anos de vida assistencial contínua e registraremos sempre para que fique na consciência de todos o período da intervenção que se alastrou de 2005 até 2013, e trabalharemos para que isso nunca mais aconteça.
A Santa Casa é a casa de Deus, e, sempre, com espírito altaneiro e com as bençãos Dele, vencendo todos os obstáculos interpostos em seus caminhos, continua com fé, esperança e amor na sua missão sagrada de curar pessoas e salvar vidas.
(*Heitor Rodrigues Freire – decano do Conselho de Administração da Santa Casa)
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Postado por: Heitor Freire (*), 26 Agosto 2023 às 09:00 - em: Falando Nisso