A lição de Al Capone contra o tráfico Marco Eusébio (*)

A lição de Al Capone contra o tráfico

 

Hoje, 26 de junho, é o Dia Internacional de Combate às Drogas instituído pela ONU. Uma série de atividades alusivas ao tema vão marcar a semana que se inicia no país e mundo afora num momento em que o mundo provavelmente o auge de um dilema de descriminalizar ou até legalizar ou não o uso de substâncias alucinógenas atualmente ilícitas.
 
Dilema à parte, o momento demonstra que autoridades de todo o planeta estão, enfim, se conscientizando de que o sistema de ilegalidade e repressão adotados há décadas são simplesmente ineficazes. Os índices de consumo e tráfico de drogas em alta em todo o planeta atestam que os Estados Unidos e aliados perderam faz tempo a chamada guerra ao tráfico. Por isso, admitindo a derrota, autoridades começam a discutir menos preconceito e com mais inteligência a liberação das drogas. 
 
A história contemporânea atesta a lógica de que probir o consumo de produtos desejados por muita gente é a razão da existência da milionária indústria do comércio ilegal. Taí o eterno sucesso dos filmes de gângsters como Al Capone e outros poderosos chefões criados pela Lei Seca estado-unidense avisando faz tempo nas telonas. A proibição de venda e consumo de bebidas alcoólicas nos EUA que vigorou de 1920 a 1933 não apenas foi ineficaz em seus objetivos como foi a principal causa do enriquecimento do crime organizado naquele país durante o período.
 
Se é fato que a proibição só faz fomentar o tráfico e o crime, também tem sido comprovado nas últimas décadas que os atuais modelos de liberação já testados em alguns países se mostraram ineficientes. A liberação do consumo de drogas em praças ou em outros locais públicos, criaram simplesmente um quadro deprimente de zumbis humanos e até ajudaram a aumentar a clientela do tráfico levando muito mais jovens a experimentar o que os viciou depois. Em outros casos, a liberação da maconha e algumas drogas químicas de venda ilícita para uso medicinal serviram apenas para criar alguns grupos de médicos traficantes, que aviam receitas em troca de dinheiro.
 
Leitores e lideranças políticas já me perguntaram se sou contra ou a favor da liberação do uso de drogas. Respondo que sou contra o uso, pois nunca tive coragem de experimentar qualquer substância ilícita, mas também sou contra a proibição, que a meu ver só fomenta o crime. Entendo que o tema é polêmico e é muito difícil vencer resistências enraizadas na cultura conservadora, religiosa e outros tipos de pré conceitos em relação ao assunto. Mas, mesmo contra a probição, acredito que a liberação só poderia advir de um sistema, no mínimo, inteligente de tratar o assunto.
 
Penso que a melhor alternativa ao dilema seria a liberação do uso de drogas em locais controlados pelo governo. No lugar de prisões, que comprovadamente não recuperam cidadão nenhum e, ao contrário, são escolas do crime patrocinadas com dinheiro público, acredito que seria muito mais eficaz o governo construir grandes clínicas para usuários de drogas nas capitais e principais cidades. Mas que nelas ofereça a liberdade de escolha. Para quem quiser, o principal atrativo: droga, gratuita, fornecida pelo governo, como já fornece muitos medicamentos. O custo para o contribuinte seria menor que o caríssimo investimento feito na repressão, já que a produção de droga é barata e elas só se tornam caras justamente pelo fato de serem proibidas e vendidas na clandestinidade fomentando o submundo do crime. 
 
É maior de idade? Quer consumidor droga pura e de graça? Cadastre-se na clínica e lá dentro terá o que quer, mas longe da vista da população e sem possibilidade de, todo "doidão", sair praticando crimes ou outros atos ilícitos e deprimentes nas ruas. Quer tentar livrar-se do vício? Cadastre-se e lá dentro encontrará psicólogos, médicos, medicamentos e até assistência religiosa de padres e pastores evangélicos que ajudem na recuperação da doença espiritual que o levou ao consumo de drogas.
 
Sei que minha ideia é utópica, mas acredito que se um dia os governantes deixarem de pensar mais nos votos que poderão perder e ousarem enfrentar as resistências e criar tais clínicas, estariam cortando pela raiz a principal fonte do tráfico: o lucro milionário. Cá entre nós, de pouco adiantaria ao traficante viciar jovens ou não pelas ruas, sendo que estes, ao adquirir o vício, deixariam de ser seus clientes para obter o produto de graça e com mais qualidade longe de suas garras. E, provavelmente, ninguém em sã consciência vai chegar nesse estabelecimento público para se cadastrar e experimentar drogas. Mas, se o fizer, estará mostrando que está com algum desequilíbrio psicológico ou emocional e terá imediato auxílio especializado psicológico ou espiritual para prevenir que adquira a doença do vício. 
 
Penso que se tal sistema fosse adotado, poderia demorar alguns anos, décadas talvez, e nem traria retorno imediato de votos que tanto interessa aos políticos, mas minaria a fonte da crescente clientela do tráfico de drogas e, consequentemente, reduziria os índices de todos os males dele advindos como assaltos, estupros, assassinatos praticados por gente que integra o negócio milionário das drogas ilícitas ou simplesmente quer conseguir dinheiro para manter o vício que atinge famílias de todas as classes sociais e econômicas. Consequências estas as quais ninguém nunca deixará de estar imune enquanto a fonte do negócio milionário das drogas não for atacada em sua raiz. Enfim, enquanto o lucro existir, qualquer medida será ineficiente.
 
Se algum deputado ou senador estiver disposto a assumir a proposta no Congresso, embora eu duvide, está à disposição a ideia. Pode até não ser o projeto ideal, mas para não ficar apenas na crítica às fórmuladas testadas, é a minha ideia. Creio que uma das muitas virtudes do ser humano, em meio aos seus tantos defeitos, é aprender com os próprios erros. E a fama de Alphonsus Gabriel Capone (o Al Capone) grita há mais de meio século que governo proibir e reprimir o uso de coisas que a população deseja serve apenas alimentar a indústria do tráfico e do crime.
 
(*Marco Eusébio, jornalista residente em Campo Grande-MS, é editor do Marco Eusébio in Blog www.marcoeusebio.com.br Entrelinhas da Notícia)


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Postado por: Marco Eusébio (*), 26 Junho 2011 às 14:58 - em: Falando Nisso


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